A Agência Antidoping dos Estados Unidos (USADA, na sigla em inglês) foi acusada na última quinta-feira, 08 de agosto, pela Agência Mundial Antidoping (WADA) de promover um esquema de fraudes que viabilizaria atletas competirem dopados ao longo dos últimos anos. O pronunciamento foi feito após reportagem da agência britânica de notícias Reuters no dia anterior.
A acusação, já grave por seu conteúdo, ocorreu através de nota oficial da entidade e reverberou mundo afora na última semana dos Jogos Olímpicos de Verão de Paris 2024, potencializando a disputa entre EUA e China e permitindo a desconfiança sobre a idoneidade dos atletas.
Antes de adentrar no caso em destaque, é pertinente contextualizar o que é antidoping. Em cenários de alto rendimento, competidores utilizam métodos artificiais para obterem vantagens físicas e psicológicas em relação a outros adversários. É o chamado doping.
Na busca por garantir a integridade dos atletas, a reputação do esporte e o milenar espírito olímpico, o Comitê Olímpico Internacional (COI) aplica, desde 1968, testes para detectar substâncias, drogas ou outros métodos ilícitos que possam melhorar o desempenho esportivo. A testagem começou a ter caráter institucional após a morte de dois atletas com suspeita de uso de substâncias nas edições de 1960 e 1964.
O antidoping não é apenas uma preocupação “Olímpica”. Diversos torneios e competições instituem testagens aleatórias aos participantes, e nos regulamentos das agências há um rol taxativo de substâncias proibidas. Cada agência pode adotar diretrizes específicas para a testagem, mas o mais observado consiste na coleta de material biológico dos atletas, como sangue e urina, feita de maneira aleatória justamente para evitar fraudes.
É nesse cenário que a acusação toma forma. Alegadamente, a USADA tinha conhecimento de que atletas dopados competiram por anos, sem nunca puni-los ou impedi-los de participar dos torneios. A WADA afirmou que possui informações sobre três atletas que utilizaram de substâncias proibidas e um quarto que admitiu tomar esteroides ao longo de toda a carreira, até se aposentar, com a anuência da USADA.
A Agência Mundial reforça que não há previsão tanto no seu regulamento, como no regulamento da agência estadunidense para situações do tipo, apontando a hipocrisia na condução dos seus trabalhos após a USADA ofertar denúncias contra as delegações Russa e Chinesa.
Em 1º de agosto deste ano, foi noticiado que os Estados Unidos acusaram a WADA de acobertar casos de doping dos principais nadadores chineses. À época da publicação, os conflitos foram interpretados como um reflexo no esporte do embate de duas superpotências globais. Não havia credibilidade nas acusações. Entretanto, após uma reviravolta quase cômica, descobriu-se que era justamente o contrário: a USADA tinha ciência e autorizou que atletas estadunidenses competissem dopados, sem relatar tais infrações.
A Agência Antidoping dos Estados Unidos defendeu a liberação para que atletas competissem dopados sob a alegação de que esses atuariam como informantes secretos, contribuindo para que o FBI, principal agência federal de inteligência dos EUA, avançasse nas investigações sobre o tráfico de pessoas e de substâncias ilícitas. Entretanto, a prática vai de encontro ao que postula o Código Mundial Antidoping, já que não há previsão para que atletas flagrados dopados possam continuar competindo.
Por conta do contexto apresentado, a USADA aconselhou que os nomes dos atletas não devem ser divulgados, afirmando que eventual exposição poderia colocar a integridade dos envolvidos sob risco.
Em suma, é possível depreender que o espírito desportivo está maculado. A confirmação de que atletas utilizaram substâncias proibidas com anuência da Agência Antidoping dos Estados Unidos levanta uma série de suspeitas sobre a extensão dos danos ao esporte e invade o imaginário popular sobre os verdadeiros limites humanos em cenários de alto desempenho, descredibilizando os feitos alcançados. A essência dos Jogos Olímpicos está ameaçada.
Autoria: Vinícius Conezza
Revisão: Ana Carolina Clauss e Laura Freitas
Imagem de capa: Julia Dorian/Shutterstock
Referências e Fontes
REUTERS. Athletes undercover: Global, U.S. anti-doping agencies clash over tactics. Reuters, 7 ago. 2024. Disponível em: https://www.reuters.com/sports/athletes-undercover-global-us-anti-doping-agencies-clash-over-tactics-2024-08-07/. Acesso em: 16 ago. 2024.
GLOBO. Agência Mundial Antidoping acusa EUA de esquema que permitia atletas de competirem dopados. Globo, 8 ago. 2024. Disponível em: https://ge.globo.com/olimpiadas/noticia/2024/08/08/agencia-mundial-antidoping-acusa-eua-de-esquema-que-permitia-atletas-de-competirem-dopados.ghtml. Acesso em: 16 ago. 2024.
CNN. Exame antidoping: entenda como é feito e quais são as consequências. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/esportes/outros-esportes/antidoping/>. Acesso em: 16 ago. 2024.
BBC NEWS BRASIL. Doping nas Olimpíadas: por que agência mundial está no meio da disputa entre EUA e China. BBC, 1 ago. 2024. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/articles/c51yn15z5peo>. Acesso em:
Doping e o Esporte: testes e controles no desempenho de alta performance. Disponível em: <https://kasvi.com.br/doping-esporte-testes-controles/>. Acesso em: 16 ago. 2024.
GE. O que explica pele roxa de nadadores ao término de provas nas Olimpíadas? Disponível em: <https://ge.globo.com/olimpiadas/noticia/2024/08/07/o-que-explica-pele-roxa-de-nadadores-ao-termino-de-provas-nas-olimpiadas.ghtml>. Acesso em: 16 ago. 2024.
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