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PRÓXIMA ESTAÇÃO: COLAPSO



Enquanto pairam alguns P. Diddys, Deolanes, Choqueis, Pablos Marçais pelo ar, o Brasil está à beira de um colapso. Com baixíssima produtividade e uma máquina estatal colossal, não há plano econômico não revolucionário que sustente o país. Os gastos do Estado em programas que não aumentam a qualidade da mão de obra, que não incentivam a educação e que consequentemente mantém a população refém do governo, são em grande parte causa desse futuro colapso. A esfera política brasileira se sustenta pelos auxílios que angariam votos, e que não trazem quase nenhum retorno positivo para o país. Uma hora as contas não irão bater: nossa população fica mais velha, mais improdutiva, com uma juventude de educação precária incapaz de se tornar produtiva o suficiente para bancar os improdutivos, e enquanto isso nos alienamos com frivolidades vazias. É preciso mudar tudo, antes que desmoronemos. E essa é uma realidade que é esquecida por todos os políticos: nenhum fala sobre isso. Ninguém está olhando para essa espécie de “voçoroca” sociopolítica e econômica.


Segundo a revista Forbes, das 2 mil maiores e mais importantes empresas do mundo, apenas 26 são brasileiras[1]. Ou seja, nós não somos tão competitivos. Isso acontece porque o Brasil é reinado por grupos de interesse e pragmatismo político. Os produtos nacionais são medíocres e ainda caros, já que para uma empresa estrangeira atuar aqui ela tem de lidar com quilômetros de burocracias e impostos. Impostos esses que são aumentados por lobismos de indústrias nacionais, vide a infame taxação das blusinhas. As principais cabeças do varejo brasileiro se reúnem com os políticos, aparecem com aquele discurso defendendo a indústria nacional e tal. Mas eu te pergunto: que indústria? Nós temos alguma indústria para defender? Você consegue comprar um produto nacional de forma acessível que tenha a mesma qualidade de um importado? 


Aí mora um dos grandes problemas do Brasil também: nós não temos indústrias. Somos um país que não exporta produtos com valor agregado, ou seja, temos que produzir muito para ganhar pouco. Não temos nem ferrovias boas para transporte e nossa matriz econômica é sustentada pelo agronegócio[2], o que nos impede de ganhar muito dinheiro. Com valor agregado, você faz um produto com baixos custos e um alto valor de venda. E temos pouca tecnologia para melhorar nossa produção. Isso, somado à educação precária no Brasil, já nos leva a um problema econômico: baixo PIB. Se você viu alguma coisa básica de macroeconomia, você sabe que podemos calcular o PIB por y=A . f(k,l) (onde y é o PIB, A é tecnologia, k é capital no sentido de maquinário e ferramentas e l é trabalho, trabalhadores). Ou seja, não temos um A alto que impulsione a nossa produtividade e PIB, nem um l produtivo, dada a qualidade da educação brasileira.


Incentivos fiscais são incapazes de solucionar nosso problema de competição global. Devemos mudar tudo. Primeiro, o imposto deve ser sobre a renda e não sobre o consumo. Do jeito atual, sobre o consumo, temos impostos que encarecem o preço dos produtos, o que diminui o consumo deles e então a mesma coisa acontece com o incentivo de se produzir aqui. Há também o problema do efeito em cascata, onde cada etapa da produção é tributada; logo, o produto sai mais caro. Segundo, o Brasil deve investir mais na educação básica ao invés de no ensino superior. Segundo o ranking PISA, nosso país apresenta 73% dos alunos com resultados insatisfatórios em matemática e uma média de 52,5% de estudantes com um desempenho abaixo do esperado nas áreas de leitura e ciências[3]. Para aqueles que ficam com medo das universidades públicas perderem suas pesquisas, prestígio, etc, pense que cerca de 86% dos gastos dessas instituições se resumem a folhas de pagamento[4]. E não há como diminuir, já que não se pode demitir em setor público. Ou seja, antes de ficar com medo de diminuir os gastos das universidades, pense que existe (generalizo aqui para fins didáticos) toda uma teia de servidores patrimonialistas que sugam o dinheiro da produtividade brasileira. Qual o sentido de investir no topo da pirâmide se a base está esquecida? Como as pessoas irão ingressar nas universidades, se as escolas que elas estudam são precárias e caóticas? É por isso que os mais ricos dominam as universidades públicas. E é por isso também que as cotas não vão nos salvar, se não se salva o ensino básico primeiro. Com uma massa de crianças que não teve seu cérebro bem desenvolvido, dada à falta de atividades educativas, como eles serão produtivos o suficiente contra um futuro japonês, taiwanês, vietnamita, chinês, americano, europeu?


Como terceiro e principal ponto, irei me aprofundar mais sobre o assunto, pois acredito que ele é um buraco muito mais fundo do que realmente enxergamos: o assistencialismo político. De antemão já aviso o leitor que eu tratarei de queridas políticas de distribuição de renda. E eu as generalizarei, assim como parte da população que as recebe, por motivos didáticos. Eu também foquei no Bolsa Família, por ele ser o mais conhecido e caricato. Todos sabemos que existem exceções, mas tratar de cada uma é impossível. Mas esses programas são apenas uma face e não a causa do colapso – embora eles acelerem muito o processo. O Bolsa Família e outros programas possuem uma intenção boa, e nisso todos concordam. Quem é contra dar uma chance às famílias mais sofridas do Brasil? Mas precisamos urgentemente rever essas políticas, pois elas são insustentáveis no longo prazo do jeito atual.


O Bolsa Família só existe do modus operandi atual pois ele é politicamente ótimo. Ele funciona sem fortes condicionalidades, o que facilita as práticas clientelistas. Distribuir dinheiro para seus eleitores de forma legal é um presente para concorrentes políticos, vide a última eleição presidencial que os candidatos disputavam por quem daria um maior aumento no benefício – assim como o auxílio emergencial. Ou, por exemplo, a famosa PEC Kamikaze, que criaria diversos outros auxílios pelo governo Bolsonaro, tempo antes da eleição. Ou seja, tais políticas na prática são assistencialistas e apenas brecam o brasileiro de ser produtivo. Dadas as fracas condicionalidades, o indivíduo recebe um salário por não fazer nada. E esse ser não vai procurar melhorar de vida, já que não há incentivos. Ele será no fim uma massa apática, alienada e economicamente pesada, mas ele representa um voto para o político. Ele precisa ser agradado, por mais caro que seja, para que o status quo político seja mantido. Mas isso é insustentável.


Isso é insustentável, porque o Brasil que banca essas práticas não vai conseguir mais daqui um tempo. Quanto mais assistencialismo clientelista, menos produtividade e dinheiro para manter tal prática. Ou seja, o país quebrará se nada for feito. E por enquanto nada está sendo feito, ninguém quer fazer algo e todos adoram se aproveitar desse rombo. Quem é formado e produtivo sai do país, porque entende que o Brasil não tem um grande futuro, todos sabemos disso, a maioria de nós tem um sonho de trabalhar fora. O brasileiro deseja trabalhar em um país que seu esforço é recompensado; afinal, é justo para a pessoa que acorda todos os dias às cinco da manhã, pega duas horas de condução da periferia até o centro, trabalha numa jornada 6x1, salário medíocre, moradia medíocre e tudo mais, para bancar a máquina estatal que despeja dinheiro em compra de votos indireta, sem nenhum ganho positivo para o país?


É justo que a parte produtiva do Brasil banque, por exemplo, os R$3 bilhões que foram gastos do Bolsa Família em bets online apenas no mês de agosto[5]? Veja: apenas no mês de agosto. Em um mês foram R$3 bilhões de reais para paraísos fiscais, jogos estelionatários. Para você entender melhor, pense que o orçamento da assistência social de toda a cidade de São Paulo, isto é, dinheiro para cuidar dos moradores de rua que morrem de fome e frio, foi de R$2,3 bilhões em 2024[6]. Nós pegamos esse valor inteiro da cidade, multiplicamos por 1,3 e então jogamos tudo no lixo. Isso é literalmente o dinheiro da parte produtiva, que vai para a parte alienada pelo assistencialismo clientelista, que gasta seu dinheiro no lixo, afinal, não nenhum imposto sequer retorna dessas bets. E ainda nem estou contando as outras políticas, como o Pé de Meia, que parte significativa é gasta pelo mesmo meio. Me diga, isso se sustenta no longo prazo? O que o brasileiro médio pensa de estudar por anos, gastar mais de um carro por ano na faculdade, para bancar esse sistema? E ainda mais: essas são pessoas emancipadas? Mês que vem, o Bolsa Família completa 21 anos de sua existência: ele objetivamente melhorou a situação do Brasil? Entenda: nada mudou. O que foi sonhado, foi mera ilusão, estamos no mesmo buraco e devemos mudar a fórmula para sair dele. Agora o que eu já tinha falado: a culpa não é integralmente das pessoas, mas sim da classe política. Ela que moldou o jogo desse jeito. Ela precisa que o jogo seja jogado desse jeito.


Enquanto não temos saneamento básico, um sistema de saúde público com maior qualidade, a já citada educação com maior qualidade etc., o dinheiro do Estado é gasto em tigrinho. Tigrinho esse que financia esquemas ilegais com facções criminosas[7], alienação do povo e desvia o dinheiro que deveria ser retornado em bens públicos. O problema é que vivemos muito distanciados da base da população brasileira. Essa base foi muito historicamente romantizada pela classe média, que pensava que a família tradicional era diferente de uma mãe e um filho que são pobres, comem mal e não têm educação e um pai que os abandonou – adivinhe: não é diferente. E essa romantização impede que essas pessoas sejam acolhidas, já que se dá um status de que eles estão vivendo bem, normal e estruturados. Essa classe social desprezada não consegue ter acesso básico à cultura; e aquele mínimo de substância cultural que ela poderia ter para moldar seus princípios e limites – por exemplo, alguma religião – é desconstruído pela pós-modernidade. Ou seja, ela acaba sendo solta no mundo, sem valores e um objetivo, mas armada com um cartão do Bolsa Família, um tigrinho, um influencer imbecil e a vida segue. Ah, e claro, com um voto disponível para o político muito preocupado com essa pessoa. Iremos para algum lugar desse jeito?


Os políticos precisam então entregar algo para essas pessoas de dois em dois anos. Mas para entregar, eles precisam tirar de alguém. E esse alguém são os produtivos. Essa é a configuração da máquina estatal há muitas décadas. As pessoas que vão embora do Brasil, a famosa ‘fuga de cérebros’, saem porque não querem pagar as despesas dessa massa improdutiva. Isso é injusto? Enquanto o resto do mundo cresce, com China, Vietnã, Ruanda crescendo e tornando o Brasil cada vez menos competitivo, esse sistema assistencialista clientelista precisará ser aumentado e isso é insustentável. A fórmula que temos hoje é: a base pirâmide demográfica está caindo[8], produtividade não aumenta, dívida pública nas alturas. Na prática, você precisará tirar de uma população mais velha e produtiva; com o tempo, essa população envelhecerá e então se tornará improdutiva; haverá maiores gastos com previdência e menos pessoas para bancar esses gastos; logo: colapso. E não adianta simplesmente multiplicar a base da pirâmide, dado que a educação é sucateada e não provirá um aumento da produtividade, e mesmo que isso fosse mentira, não há incentivos a se esforçar devido às práticas assistencialistas clientelistas. Estamos em um ciclo vicioso que nos levará a quebrar de fato.


E quem está falando sobre isso? Há algum político sério que propõe algo para frear esse caos? A população brasileira está abordando esse tema, debatendo? Ninguém fala sobre isso. Ninguém tenta consertar o que está estruturalmente errado. E veja, os políticos que vão assumir as cadeiras executivas e legislativas são os mesmos. Vamos eleger os mesmos políticos que estão nos derrubando, apenas veja as pesquisas. Para presidência teremos novamente petistas e bolsonaristas, e na prefeitura a mesma coisa. Nenhum deles conseguiu mudar o rumo do país, e mesmo assim eles continuam no poder. É difícil mudar essa dinâmica, já que os políticos derivam muita utilidade de como o jogo funciona hoje, assim como parte da população, sejamos sinceros. Ambos se completam, se abraçam e caem do precipício, mas no caminho eles levam todo o resto do povo. Enquanto os candidatos falam de propostas absurdas, lacradas ridículas, polêmicas, infantilidades, o buraco cresce. Veja, o maior problema do Brasil não é o “consórcio comunista” ou o “fascismo”, mas é muito divertido pensar assim. Mas enquanto isso, o rombo está na frente de todos nós e ninguém quer fazer nada. Ele está na nossa frente e quase todos não o enxergam. Mas ele continua lá. Não é porque não vemos que significa sua inexistência. Se não mudarmos as regras do jogo, ele nos engolirá. Se não mudarmos as regras do jogo, nós perderemos o jogo, talvez para sempre.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


  1. Forbes Global 2000. (2024). Forbes. Disponível em: https://www.forbes.com/lists/global2000/. Acesso em: [25/09/2024].


  1. Feldmann, P. (2023). Por que a produtividade do Brasil é tão baixa?. Jornal da USP. Disponível em: https://jornal.usp.br/articulistas/paulo-feldmann/por-que-a-produtividade-do-brasil-e-tao-baixa. Acesso em: [25/09/2024].


  1. Mau resultado do Brasil no PISA está ligado ao baixo investimento na educação pública (2023). CartaCapital. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/educacao/mau-resultado-do-brasil-no-pisa-esta-ligado-ao-baixo-investimento-na-educacao-publica/. Acesso em: [25/09/2024].


  1. Custo com servidores representa 86% do orçamento das universidades (2019). Escola de Economia de São Paulo - FGV. Disponível em: https://eesp.fgv.br/noticia/custo-com-servidores-representa-86-do-orcamento-das-universidades. Acesso em: [25/09/2024].


  1. Beneficiários do Bolsa Família gastam R$ 3 bilhões em bets só em agosto (2024). Folha de S.Paulo. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2024/09/beneficiarios-do-bolsa-familia-gastam-r-3-bilhoes-em-bets-so-em-agosto.shtml. Acesso em: [25/09/2024].


  1. Prefeitura de São Paulo. Políticas sociais e mudanças climáticas são destaques do orçamento de São Paulo para 2024. Secretaria Municipal da Fazenda. Disponível em: https://capital.sp.gov.br/web/fazenda/w/noticias/34196. Acesso em: 27 set. 2024.


  1. O Globo. PCC, Comando Vermelho e bicheiros usam bets para lavar e ampliar seus lucros. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2024/06/23/pcc-comando-vermelho-e-bicheiros-usam-bets-para-lavar-e-ampliar-seus-lucros.ghtml. Acesso em: 27 set. 2024.

  2. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pirâmide etária: conheça o Brasil - população. Disponível em: https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18318-piramide-etaria.html#:~:text=Em%201980%2C%20a%20popula%C3%A7%C3%A3o%20brasileira,19%2C8%25%20em%202022. Acesso em: 01 out. 2024. ___________________________________________________________________


Autoria: Raphael Adans

Revisão: André Rhinow, Laura Freitas, Artur Santilli Imagem de capa: NBC News


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