L: Oi, Rô!
R: Oi, Lu! Pode entrar. Quer um café, alguma coisa?
L: Ah, não precisa, Rô, obrigado.
R: E aí, como você está? Faz um século que eu não te vejo.
L: Pois é! Eu surtei essas férias sem terapia.
R: Eu imagino. Mais tempo sozinho com a sua cabeça.
L: Nem me fale. Eu estou com quinhentas preocupações.
R: Quando você não está?
Rimos.
L: Nunca. Literalmente. Não consigo me lembrar de uma vez em que estive sem preocupações. Quando uma passa, já têm umas 10 outras na fila de espera para assumir seu lugar.
R: Você não tem paz.
L: Não mesmo. Eu fico em um looping na minha mente. Você sabe, eu sempre imagino o pior cenário para todas as situações.
R: Por que você tem uma visão tão pessimista das coisas? Você sofre por antecedência.
L: Eu sei. Acho que esse é o jeito que minha cabeça funciona. Eu tenho Lua em Escorpião! É a minha natureza.
Rimos
R: Mas o que você ganha com isso? Qual a finalidade da sua mente ficar imaginando esses cenários negativos?
L: É que eu sempre quero me preparar para o pior. Se der alguma coisa melhor que isso, é lucro.
R: Como você se sente quando dá tudo certo?
L: Eu sinto que consigo respirar. Dura pouco, pouco mesmo. Em questão de segundos, mudo meu foco para outra preocupação. É a mesma coisa com os meus objetivos. Eu nunca acredito que vou atingi-los, sempre acho que vai dar tudo errado. Mas, quando tudo dá certo, eu sinto mais alívio do que felicidade. Eu sei que é meio esquisito, mas é como me sinto.
R: Parece que você não quer ser feliz.
L: Eu quero. Muito. Tudo o que eu faço é para ser feliz. Mas, para mim, as coisas nunca estão boas. Estou em um lugar e gostaria de estar em outro, atinjo algo e percebo que quero outra coisa. Parece que sempre quero ser outra pessoa.
R: A grama do vizinho é sempre mais verde.
L: E nem só isso, só consigo focar nos aspectos ruins da minha vida, nos meus problemas. Mas só quero ser feliz.
R: É contraditório você dar tanta importância para as coisas ruins e querer ser feliz ao mesmo tempo. A vida de todo mundo tem coisas ruins.
L: Sinto que tem vidas melhores do que a minha.
R: O que falta na sua vida?
L: Eu não me sinto muito amado. Meus pais me amam, mas não sinto que eles me amam incondicionalmente. Tem partes de mim que sinto que eles não amam.
R: Eles amam quem você é?
L: Eles amam a ideia que eles têm de mim.
R: A sua sexualidade não faz parte dessa ideia.
L: Nem um pouco. Mas não é nem só sobre minha sexualidade. É sobre quem eu sou, como eu me expresso, como eu falo e me comporto. Quando eu saí do armário meu pai falou para eu ser discreto, que existem gays que vão trabalhar de terno, jogam futebol com os amigos, se comportam que nem “homens” e não “aparentam” ser gays.
R: Eles não querem que você aparente ser gay?
L: Não.
R: Mas você não acha que uma parte deles quer te proteger da homofobia no mundo?
L: Pode até ser, mas uma parte deles tem vergonha de quem eu sou. Eu lembro de uma situação, em 2020, em que minha foto de perfil no WhatsApp era uma selfie minha com um efeito de Instagram que colocava umas borboletinhas na minha cabeça. Meu pai me mandou várias mensagens falando para eu apagar. Perguntou se aquela era a imagem que eu queria passar e disse que a família e os amigos dele tinham meu número no WhatsApp e poderiam ver.
R: E você manteve a foto?
L: Sim. Para incomodá-lo mesmo. Depois de um tempo, tirei porque era meio cafona, mas whatever...
R: E por que você se importa com o que eles pensam?
L: Porque eles são meus pais. Eles são as pessoas que mais deveriam me amar no mundo.
R: Lu, o mundo é muito grande. Muitas pessoas vão te amar.
L: É. Talvez. Mas outros tipos de amor.
Autoria: Luís de Paula Eduardo
Revisão: Anna Cecília Serrano e Lucas Tacara.
Imagem de capa: Robert Williams, Shafrazi Gallery, Berkshire Fine Arts
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