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NOS CORREDORES DA FGV

A Gazeta Vargas tem o orgulho de dizer que firmou mais uma parceria incrível, dessa vez com a Revista Ágora, da FGV-Rio. O texto de hoje expressa o sentimento que nós, gevenianos, sentimos todos os dias: saudades de nossa querida faculdade. Será que tudo vai voltar ao que era antes ou devemos estar preparados para uma vida universitária completamente diferente?

Nos curtos instantes enquanto eu subo até o 8º andar pelo elevador, no primeiro dia de aula, diversos pensamentos me atravessam (para além de: esse elevador é louquíssimo, ele quase prendeu minha perna fechando suas portas). Como serão as salas? Será que as cadeiras serão as mesmas nas quais eu fiz a prova do vestibular? Como serão os corredores? Eles continuarão a conter o mesmo silêncio e a mesma tensão daquele dia? E o mais importante: como serão as pessoas? Será que eu terei um tratamento frio e sério, assim como a primeira impressão da faculdade me passou?


Todos esses questionamentos foram sanados, no entanto, a partir do momento em que eu saí do elevador e dei meus primeiros passos por aquele corredor que viria a se tornar uma imagem muito familiar em minha mente. As janelas de parede a parede, que davam grande abertura para que a iluminação do sol pudesse penetrar no ar e no piso gelados, logo de cara, indicavam que a experiência seria mais acalorada do que minhas dúvidas plasmaram.


E, muito que bem, assim se procedeu. Quando avistei o local em que as calouras e os calouros se reuniriam, em frente a nossa sala, preenchido por uma mesa cheia de guloseimas, salgados e mimos (o famoso coffee break, que, mal sabia eu àquela época, seria uma prática recorrente da faculdade, assim como sua invasão pelos alunos), meu corpo, coração e mente se amornaram imediatamente. Óbvio que a recepção das pessoas que organizaram e cuidaram de todo o evento impulsionaram e muito esse sentimento. Mas o foco e o papel da mesa cheia representaram uma imagem convidativa forte e inevitável.


A partir daí, a aventura de descobrimento da FGV se iniciou - e se estendeu de forma intensa até o final do primeiro ano. Eu e as recém-feitas amigas e amigos inquirimos os 4 cantos daquele prédio, seja na busca por uma máquina de café que nos proporcionasse a melhor experiência gratuita de energia, seja com a finalidade de arranjar uma salinha para que conseguíssemos nos concentrar e estudar.


Das numerosas, porém insuficientes, salinhas e sofás do 8º e 9º andar à silenciosa biblioteca anexa ao prédio principal (a famigerada “Rita(lina)”) e, pasmem, até as salas de prédios da FGV que ficavam noutra rua, qualquer espacinho era apropriado para se puxar o computador da mochila e fazer as leituras da semana ou confeccionar um trabalho em grupo. A adequação desses lugares, aliás, também se refere a possíveis locais para tirar aquela soneca bem-merecida pós-aula ou pós-leitura. Foram incontáveis as vezes em que eu me encolhi em uma das confortáveis poltronas do corredor do 8º, colocava uma música da Carly Rae Jepsen e apagava completamente.


Mas nem só de memórias positivas vive a pessoa geveniana. Apesar de serem muito vívidos os momentos de alegria e de conforto nos corredores daquela faculdade, também se fazem presentes, e com infeliz frequência, as situações de angústia, ansiedade e esgotamento. Por ser uma faculdade, e não o ensino médio, obviamente o ritmo de estudos seria diferente - mas podia ter um aviso para o quão demandante seria, sabe? Muitas pessoas foram pegas de surpresa - umas mais que outras - pela dificuldade e complexidade das matérias e da vida na FGV (e acredito que isso está expresso na quantidade de pessoas que saíram da faculdade logo no primeiro período). E, querendo ou não, é um teste de resiliência que molda a vida das pessoas - sendo que aquelas que não conseguiram “passar” não figuram, de jeito nenhum, como fracassadas - e que, não obstante, estimula as pessoas que passam por esse processo a saírem da sua zona de conforto e a buscarem formas e meios de se adaptar.


A maneira encontrada por mim e por diversas pessoas aliadas nessa luta foi ficar na faculdade até altas horas da noite. E, sim, é isso mesmo que todos estão pensando, eu tinha aula desde as 7 e 30 da manhã, e somente ia embora às 9 horas da noite. Havia pessoas que eram ainda mais inimigas do fim e ficavam até as 10/10 e meia da noite, com o risco de fecharem a faculdade e a pessoa estar lá lendo um texto para o próximo dia.


Havia semanas que a empreitada do estudo era tão tremenda que eu e mais algumas guerreiras íamos à faculdade até nos dias de Sábado e Domingo. Esses dias eram, de alguma maneira, legais, pois a faculdade se encontrava mais quieta - e, na visão dessas pessoas, mais própria para estudo que as próprias casas. Aliás, não foram poucas as vezes em que isso se realizou - o que, de alguma forma, tornaria isso menos extremo em minha mente -, mas, pelo contrário, houve um período em que quase toda semana eu me encontrava naquele prédio e naquela biblioteca nos fins de semana.


Contudo, por mais que tenha valido a pena naqueles momentos, e a dedicação tenha rendido frutos (sem querer reforçar uma ideia meritocrática), o tanto de contato e respiração compartilhada com aquele lugar te drena e te consome um pouco. A partir dos períodos subsequentes, houve dias em que eu não conseguia mais ficar naquele espaço por muito tempo depois que as aulas diárias acabavam. O sentimento de sufoco era real e a necessidade de ir para casa após 12 e 50 ou 15 e 40 era premente demais para ser ignorada. Após essas semanas de reação alérgica eu consegui passar espaços de tempo na faculdade, mas tudo bem regulado e sem o mesmo vigor de antes. E eu acredito que isso serve para ilustrar também que a faculdade é importante e, principalmente nos primeiros instantes, demanda bastante da sua pessoa, mas que (olha que incrível), nós precisamos viver e respirar fora desse ambiente. E, em alguma medida, é importante nutrir uma relação de amor e ódio. É aquele famoso ditado né: um pouco de droga, um pouco de salada.


Mas muitos desses sentimentos e emoções que são proporcionados não são inatos e próprios do lugar em si. Tudo isso é proporcionado pelas pessoas que “habitam” esse lugar, de diversas formas. São as alunas e alunos, professoras e professores, funcionárias e funcionários que dão vida a esse lugar; que trazem o calor e o conforto mencionados; que compartilham as próprias angústias e até, às vezes, suscitam desespero em mim por conta de matéria; que, enfim, movem a faculdade e a fazem acontecer.


Sem essas pessoas, as salas de aula estariam vazias e não proporcionariam sequer metade das experiências divertidas e interessantes que aconteceram (e não proporcionariam metade dos conflitos que se concretizaram). Sem ninguém para conversar nos corredores, os intervalos seriam monótonos - apenas pegar um café na máquina ou comprar um brownie na vendinha e voltar para a sala sem ter aquela sensação de alívio de que uma aula acabou e você pode interagir de uma maneira mais leve. Se sua amiga não estivesse lá para passar fome no mesmo momento em que sua barriga ronca, vocês não fariam uma visita ao mercado próximo a FGV para fazer um lanchinho da tarde. Se o crush não estivesse passando por você pelo corredor e não te encarasse por quase que infinitos, mas efêmeros, 2 segundos, seu coração não palpitaria de maneira tão intensa. Se o professor não ficasse aqueles 15 minutinhos depois do horário de aula em frente a sala, você não sanaria aquela dúvida pulsante de maneira tão facilitada e imediata.


Mas, mais importantemente: se sua amiga ou colega não estivesse do seu lado te apoiando quando você tem uma importante apresentação de trabalho, talvez a experiência tivesse sido mais pesada ou pior; se não tivesse uma pessoa para te confortar e dizer que vai ficar tudo bem depois que você recebe uma nota ruim em determinada prova, talvez o processo de se recuperar do baque tivesse sido mais excruciante; se não tivesse uma colega de classe para concordar (e te dar suporte) com sua reclamação a respeito de um professor ou uma professora, você talvez achasse que o que ele/ela fez foi normal, quando, na verdade, não foi.


Enfim, todas essas experiências servem para ilustrar um ponto: somos nós quem fazemos os corredores (e a faculdade, como um todo) ser de determinado jeito. E isso serve como uma forma de nos empoderarmos, sabe? Se o ambiente está bonito e agradável, é por causa de nós que ali habitamos e deixamos um pouco desses sentimentos impressos nesse lugar.


Porém, contudo, todavia, entretanto, como já dizia o Tio Ben: com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades. E sim, nós todos temos uma espécie de dever de criar o melhor ambiente possível, seja para nós mesmos, seja para as pessoas que habitam o espaço em conjunto conosco e para aquelas que o habitarão algum dia. Obviamente, não conseguiremos cumprir esse dever nem de maneira perfeita, nem a todo tempo; mas, felizmente, isso não nos impede de tentarmos.


Eu finalizo essa longa e nostálgica recordação de momentos e vivências apontando para um sentimento de saudade: tudo isso por conta do globalmente conhecido vírus. Apesar de todo o trabalho e o sofrimento que dá para manter a vida geveniana, seria uma inverdade afirmar que essa faculdade nunca proporcionou momentos alegres - e por isso ela sempre vai figurar no meu imaginário como uma segunda (ou terceira) casa. Dessa forma, o único questionamento que permanece em minha mente (mesmo que não originário daquele primeiro dia de aula lá) é: Cadê a Vacina?

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