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E COMO SE SENTE EM RELAÇÃO A ISSO?



Você já esteve em um lugar onde o desconforto por estar lá era proporcional à necessidade de permanecer ali? Quando não se tem pra onde fugir, há dois caminhos possíveis: contemplar o processo ou forjá-lo. A princípio, pode soar confusa essa ideia de estar onde não se quer por necessidade de chegar onde se deseja. E o lugar de desejo não é imóvel - sequer é palpável -, o que significa um esforço constante para se manter em movimento. Certamente, todas essas vagas reflexões ficarão mais fáceis de serem compreendidas com um contexto, já que uma história por trás das coisas facilita nossa assimilação e atiça a curiosidade. Pois bem, comecemos com um diálogo:


- Eu sempre penso nisso, sabia?! - eu disse à mulher em quem confiei essa conversa e muitas outras.


- E como se sente em relação a isso? - indagou.


Nesse momento, quando não se tem resposta certa, errada ou esperada, quando a minha descrição - mais que isso, a externalização do que sinto - conduz o fio da sessão, eu travo por alguns segundos. Essa pequena fração de tempo me faz pensar que facilmente eu sairia dali e deixaria a pergunta em aberto. Nesses instantes, meu pensamento atrapalhado poderia ser confundido com um quarto bagunçado, cuja semelhança é a dificuldade em saber por onde começar a organizar.


Parando para pensar, um quarto é uma boa analogia acerca dos pensamentos que se desatam na terapia. Se a ele recair adjetivos, a riqueza da comparação poderá ser vista nos detalhes. Eis o cômodo: redondo, formato que não permite choramingar pelos cantos. Coberto por espelhos quebrados, que oferecem imagens distorcidas de mim mesma. Bagunçado, cheio de coisas guardadas que não são mais úteis.


Em toda sessão de terapia eu adentro esse lugar-problema e tento arrumar um pouco dessa bagunça, em um processo lento e que demanda esforço. Dessa forma, a cada resposta ao “e como se sente em relação a isso?”, vejo que uma peça é colocada no devido lugar (o que não torna o espaço organizado, e sim com uma peça a menos em desordem). Por vezes, como é o caso, a resposta demora a sair, mas sai:


- Como eu me sinto? Eu sinto muito. Não no sentido de me lamentar, por mais que às vezes eu acho que devesse. Sinto muito, muito intensamente, tudo e ao mesmo tempo - respondi.


Reconheço que as palavras não foram claras o suficiente e que provavelmente a próxima pergunta vai ser do tipo “O que significa esse sentir tudo?”. Nesse caso, o “tudo” é sinestésico, evocando sentidos que dariam mais um texto, então vou guardar a oportunidade.

A questão é que, neste momento, tenho dúvidas se estou contemplando cada degrau do processo de autoconhecimento ou se crio histórias como essa para forjar as - ou fugir das - etapas. Analogias servem para explicar relações que podem ser abstratas, explicar o desconhecido pelo conhecido, o estranho pelo que é familiar, estabelecer semelhanças entre dois pontos, então o que tiro de tudo isso e aproveito para finalizar esta estranha digressão são dois pontos:


I. Quando digo que a sessão de terapia é um processo de organizar um quarto cheio de bagunça, apego-me a uma dimensão física (quarto) para que o tumulto mental pareça tangível;


II. pressuponho que o caos está fadado a se ajeitar. E preciso acreditar que está mesmo.


Revisão: João Vitor Vedrano e Letícia Fagundes

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