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ENTREVISTA - CÂNCER DE MAMA

Outubro já acabou, mas o cuidado deve ser levado para o ano inteiro! A Gazeta finaliza a cobertura especial do mês de outubro rosa com uma entrevista especial com a doutora Débora Garcia, realizada por nossa repórter Thaís Ferrari. Entenda tudo sobre o perigo do câncer de mama e aprenda como o seu tratamento é realizado


Dra. Débora Garcia y Narvaiza


Dando continuidade às postagens sobre o Outubro Rosa, trazemos uma entrevista com a mastologista e ginecologista Dra. Débora Garcia y Narvaiza, que coordena o serviço de referência em tratamento de câncer de mama de Mogi das Cruzes (referência do alto tietê). Agradecemos profundamente a Dra. Débora pela sua disponibilidade e empenho em nos conceder essa entrevista e compartilhar seu conhecimento e experiência.


O que exatamente é o câncer de mama e como ocorre a sua formação?

Simplificadamente, todo câncer, não só o de mama, advém de uma célula que “perdeu o controle”. As células do câncer são células que sofreram uma mutação, tendo uma ordem genética alterada, o que faz com que elas se multipliquem sem coordenação e não obedeçam às ordens do corpo. Quando células mutadas da mama se juntam, formando um nódulo, surge o câncer de mama.


Em relação à prevenção, a Sra. poderia falar um pouco sobre os principais fatores de risco e quais medidas podem ser tomadas para prevenir essa doença?

As medidas que podem ser tomadas para reduzir as chances de se ter câncer de mama podem ser aplicadas na prevenção de diversas outras doenças e incluem, por exemplo, ter uma alimentação balanceada e fazer exercícios físicos. Já fatores que aumentam o risco incluem a ingestão de álcool e hormônios de maneira não controlada. Isso não quer dizer que quem toma pílula vai, necessariamente, ter mais chance de desenvolver a doença, pois o fato é que os fatores de risco e as medidas de prevenção adicionam ou retiram pouco da chance de uma pessoa desenvolver essa doença. Existem casos de mulheres que se alimentam muito bem, fazem exercício regulares e ainda assim tem câncer de mama. Na verdade, ser mulher e ter mama já são os maiores fatores de risco.


O câncer de mama é genético? Se alguém da sua família teve, você tem mais risco de ter?

Existe um fator genético. Logo, se outros membros da família de uma mulher tiveram câncer de mama, o risco dessa mulher desenvolver a doença é maior do que o de outra sem registros de casos na família. Porém, mesmo sem o histórico de casos de câncer de mama na família, qualquer mulher pode ser a primeira da família a ter esse tumor.


A atriz Angelina Jolie efetuou a retirada preventiva da mama por ter alto risco de desenvolver câncer de mama. Este procedimento é realmente eficaz e pode ser realizado sem indicação médica?

A retirada preventiva é eficaz, mas só em casos bem específicos. No caso da Angelina Jolie, além de sua mãe ter morrido precocemente de câncer de mama, o seu teste genético deu positivo para o BRCA1. Trata-se de uma alteração genética que indicava alta chance, 87%, da atriz desenvolver o câncer mama. Diante deste quadro, houve a recomendação de realizar a adenomastectomia, que é a retirada da glândula mamária, preservando-se a areola e o mamilo e colocando-se uma prótese por baixo da pele. Com esse procedimento, as chances de Angelina ter a doença no futuro caíram de 87% para 3%, um resquício de possibilidade devido à manutenção de uma pequena parcela do tecido que fica atrás da areola.


Importante destacar que a adenomastectomia só pode ser feita quando houver indicação formal. Não é toda mulher que terá a necessidade de realizar esse procedimento, que só se aplica em casos com grandes chances de desenvolver a doença, como o da Angelina Jolie.


Diagnosticar um câncer no início aumenta muito as chances de cura. Realizar exames periódicos pode ajudar nesse diagnóstico. Além da mamografia, existe algum outro exame que a mulher deva realizar?

A rotina para as mulheres acima dos 40 anos, idade a partir da qual há maior incidência desse câncer, é realizar anualmente a mamografia para que se tenha um diagnóstico precoce, ou seja, para que se identifique um possível um nódulo que ainda não é palpável. Esse exame é o “carro-chefe” dos exames diagnósticos. Caso a mama seja densa ou haja alguma suspeita, pode-se complementar a mamografia com diversos outros exames, que incluem ultrassom das mamas, a tomossíntese (uma mamografia 3D), a mamografia com contraste e a ressonância de mama. A mamografia é a base e esses outros exames de imagem a complementam.


O rastreamento do câncer de mama é diferente nos casos de mulheres que apresentem alto risco de desenvolver esse tumor, seja por alteração genética, casos de câncer de mama na família ou por ter feito uma biópsia que indicou uma lesão que pode virar um câncer. A recomendação para essas mulheres é de fazer a mamografia e, 6 meses depois, uma ressonância.


Apesar da incidência mais baixa, existem mulheres jovens, abaixo dos 40 anos, que também têm câncer de mama. Nesses casos, como a mama é densa, não é possível “ver” praticamente nada na mamografia. O rastreamento, então, é feito com exames clínicos. Geralmente, a mulher jovem diagnostica um nódulo que ela mesma apalpou. Ao trazer essa reclamação, é indicado, primeiramente, fazer uma ultrassonografia. Esses exames não são necessários para todas as mulheres abaixo dos 40 anos, só são recomendados quando for percebida alguma alteração. Ressalta-se aqui a importância do autoexame, no qual a mulher se examina e se conhece. Assim, caso haja alguma alteração, ela será a primeira a perceber.


Uma vez feito o diagnóstico, qual o médico especializado para tratar o câncer de mama?

O tratamento é multidisciplinar. Em um primeiro momento, o mastologista conduzirá o diagnóstico e o tratamento. Porém, essa mulher passa por vários especialistas, incluindo mastologista, oncologista, radioterapeuta, psicólogo, nutricionista e fisioterapeuta. Todos esses especialistas têm contato entre si, não é algo isolado.


A retirada da mama é obrigatória em todos os casos? Como é feito o procedimento de reconstrução da mama? Ele pode ser realizado na mesma cirurgia da retirada?

A retirada completa não é necessária em todos os casos. Hoje em dia, se faz menos mastectomia, que é a retirada total da mama, e mais a quadrantectomia, que é a retirada de apenas um setor da mama, ou seja, retira-se o nódulo com uma margem de segurança. Nos casos em que os nódulos são grandes, o comum é que se faça a quimioterapia antes da cirurgia. Assim, o tumor diminui e é possível fazer a retirada apenas parcial da mama.


A reconstrução pode ser tanto imediata, feita na mesma cirurgia de retirada da mama, quanto tardia, feita posteriormente à retirada. Fazer no momento ou posteriormente depende de vários fatores, incluindo desde o estágio do câncer até a preferência da mulher.


Após a retirada da mama, quais os próximos passos do tratamento?

Em geral, o tratamento se baseia em cinco pilares: cirurgia, quimioterapia, radioterapia, hormonioterapia e terapia alvo. Porém, o câncer de mama é uma doença muito heterogênea e o tratamento varia de caso a caso. Assim, não é toda mulher que necessitará realizar todos esses procedimentos. O tratamento pode ser impactado, por exemplo, pelo grau de desenvolvimento do tumor e pelo tipo de câncer de mama.


Em relação à medicação, é importante citar um dos medicamentos que tem apresentado excelentes resultados: o Trastuzumabe. Esta medicação é utilizada quando as pacientes apresentam um tumor positivo para HER2.


Após a cura do câncer de mama, quais cuidados a mulher deve ter? Quanto tempo até que se possa dizer que ela está 100% curada?

No primeiro ano após o tratamento, o acompanhamento é trimestral. Já no segundo ano, o acompanhamento é semestral. É exatamente nos dois primeiros anos após o tratamento que existe maior risco de haver a recidiva, ou seja, do câncer voltar. Em geral, cinco anos após a retirada, começa-se a falar propriamente em cura mas, às vezes, podem ocorrer recidivas tardias. Então, é complicado falar em uma cura definitiva, é uma questão de evolução do quadro do paciente.


O foco dessa entrevista foi o câncer de mama feminino, por ser muito mais comum do que o câncer de mama masculino. Porém, muitos ainda creem que essa doença é exclusiva das mulheres. Você poderia falar um pouco do câncer de mama masculino e o porquê deste ser tão mais raro que o feminino?

O homem tem as glândulas mamárias muito diferentes da mulher e o que ele tem é um primórdio de tecido mamário. O hormônio que prepondera nos homens é a testosterona e, até por isso, o homem tem muito mais chance de ter câncer de próstata do que de mama. A proporção de câncer de próstata entre os homens é mais ou menos a mesma do câncer de mama entre as mulheres. São tumores muito parecidos. O câncer de mama masculino ocorre na proporção de 1%, ou seja, a cada 100 casos de câncer de mama, 99 são de mulheres e 1 de homem. No caso masculino, não se faz o rastreamento da doença por mamografia, porque seria uma irradiação e um gasto desnecessários. Geralmente, o homem é que apalpa um nódulo e procura assistência médica..


Por último, no Brasil são poucos os que têm acesso a planos de saúde que cobram desde exames periódicos até o tratamento do câncer de mama. Os exames diagnósticos e o tratamento são oferecidos pelos SUS?

O SUS oferece tudo: mamografia, cirurgia, radioterapia, quimioterapia, reconstrução etc. Porém, por mais que os exames e o tratamento sejam oferecidas pelo SUS, o acesso a esse serviço varia de local para local no País. Em São Paulo, existem vários postos, mas não é assim no Brasil inteiro. Assim, algumas mulheres têm dificuldades de ter acesso a esses serviços, mas em teoria eles são oferecidos pelo SUS.


No Brasil, acontece um rastreamento oportunístico, o que significa que as mulheres têm acesso a mamografia tanto pelo SUS quanto pelos convênios particulares, mas não são convocadas a realizar esse exame. Assim, elas só vão se quiserem e isso nos casos em que sabem que têm acesso a esse exame. Por diversos motivos, não são todas que farão o exame. Em alguns países europeus, por exemplo, as mulheres recebem telegramas em suas casas convocando-as a fazer a mamografia e, nestes locais, as mulheres possuem um acompanhamento no mesmo serviço por anos. Isso não existe no Brasil, nem nos planos privados nem no SUS, ou seja, fica a critério da mulher decidir ou não fazer o exame.

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