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(AR)TE



às vezes, penso em todas as poesias que já escrevi com o vapor do chuveiro. assistir ao lento processo do vidro embaçando novamente e enchendo o espaço das letras recém formadas até que elas sumissem era terapêutico. obviamente, nunca permiti que elas sobrevivessem mais do que breves minutos. sempre acreditei que há coisas que merecem ficar assim… presas em um momento entre eu e o silêncio.


no fim, me aconcheguei tanto nessa filosofia que criei para mim mesma que acabei levando a vida assim, guardando momentos como prisioneiros dentro da minha memória, me restando apenas torcer para que não os esquecesse.

parte de mim gostava dessa dinâmica. saber que tudo só pode ser vivido uma única vez fazia com que as coisas fossem sempre rodeadas de uma mutabilidade intrigante. afinal, o que é a vida além de uma sequência de momentos infinitos que, um dia, chegam ao fim?

ao mesmo tempo, precisava admitir que essa inconstância era assustadora. perceber que o rápido movimento no qual as coisas corriam era independente da velocidade que o meu próprio tempo andava me deixava, na maioria das vezes, paralisada. e só me restava ficar assim. parada. apenas observando.

talvez a saída seja deixar que as palavras que sumiram com o vapor do tempo assumam uma forma eterna sobre os traços deixados sobre o papel. permitir que a lembrança tome o lugar do esquecimento e permitir que a beleza seja vista mesmo que em meio à tragédia.

talvez a saída seja transformar todas as palavras não faladas e os sentimentos não sentidos em poesia. colocar no mundo uma representação mal feita de pensamentos inacabados, esperando para ver se eles encontram seu sentido fora da minha própria cabeça. tentar extrair algo da dor e, com um pouco de ar e tempo, transformar em arte.

pela primeira vez, me permitir sentir. me expressar. sem medo. apenas sentir.


Autoria: Victorya Pimentel

Revisão: Lucas Tacara e André Rhinow

Imagem de capa: s6phir no tumblr



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