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(SOBRE OS NOVOS TEMPOS) A PRESSA QUE AFASTA A RECIPROCIDADE


Para além da pressa pelos momentos, há também a pressa pelos sentimentos que assolam a modernidade. A nossa redatora Isabella Grimaldi escreve sobre o medo de assumir o coração e a representação dos novos tempos


Queria entender…


Queria entender por que o que era não é mais, por que a pressa tomou conta do mundo e fez do imediatismo uma ordem e desejo efervescente.


Ninguém mais assume se gosta ou não, é tudo na base das máscaras e do esconde-esconde. É como na brincadeira dos velhos tempos: todos se escondem e quem for pego passa a procurar os outros. Assim, o primeiro que der indícios de sentimento sofre a tristeza da não reciprocidade e passa a procurar outros amores para, quem sabe, conseguir sair do tão temido "fundo do poço". A pressa pelo amor e pelas experiências acaba atrasando o essencial, porém invisível, a todos: o amor próprio.


Amor próprio não é somente um sentimento de autoaceitação ou autoveneração. É ter a habilidade de reconhecer o que merece – o que é diferente de aceitar o que acha que merece. Muitos pensam que estar sozinho é sinônimo de estar triste e de se sentir vazio, sem ninguém para conversar e contar as ansiedades e as felicidades. Esse pensamento induz as pessoas a entrarem em um ciclo vicioso, sempre à procura de alguém, de um "tapa buraco" que vai lhes proporcionar momentos repentinos e efêmeros de felicidade, mas não cessar aquela sensação de solitude, estimulando os ansiosos pelo amor a se submeterem, novamente, a determinadas situações desgastantes.

O que precisa ser compreendido é que a solidão pode ser um luxo, já que é um encontro do eu com o eu, aflorando o autoconhecimento e permitindo que este ''eu'' se entenda e se ame. Depois disso, o amor que chegar irá extrapolar o ''eu'' e não apenas completá-lo, o que acaba com a dependência que as pessoas têm umas das outras para serem felizes.

Aceitar um amor qualquer só para satisfazer os prazeres carnais é uma prova da falta do olhar voltado a si próprio, da falta do amor à solidão consigo mesmo. Todos têm direito de satisfazer seus desejos e não necessariamente com pessoas importantes em suas vidas. Isso é a natureza. Mas que pare aí. Amor é mais do que um desejo, é algo tão pouco explorado e conhecido que muitos dizem sentir, mas, na verdade, mal sabem o que sentem. Olhar para aquele "amor de uma noite", que todos têm, e tomá-lo como o "amor que eu sempre quis" é um insulto a todos os apaixonados, a todos os possíveis significados de amar e, principalmente, a você mesmo.



Esse contentamento com o resto, com o pouco, é o que representa os "novos tempos". Tempos de fluidez e tempos do amor virtual. Tempos em que o racional comanda e supera o emocional, evitando, assim, constrangimentos e sofrimentos. Mas o que seria da vida sem os riscos? Seria algo pré-estabelecido, sem possibilidade de mudança, seria essência sem acidente, um rio sem águas mutáveis, a vida sem dar chance de melhora ou recomeço.


Aceitar os riscos é querer o melhor sempre, é moldar o autoconhecimento. Aceitar um amor dos novos tempos é viver num rio que nunca muda, cujas águas não geram a sensação de flutuação. É querer ser precavido se privando das múltiplas experiências que o Universo nos expõe.

Arriscar-se nos novos tempos é viver bem como nos velhos, verdadeiros e emocionantes tempos. É gozar os prazeres da vida que, por hora, estão reprimidos pelo medo de assumir o coração.



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