WISH YOU WERE HERE: 50 ANOS DA OBRA-PRIMA DO PINK FLOYD
- Pedro Anelli Bastos
- 24 de set.
- 5 min de leitura

Após o estrondoso sucesso de The Dark Side of The Moon, de 1973, o Pink Floyd se reuniu novamente nos estúdios Abbey Road para iniciar as gravações de seu novo trabalho. Durante esse processo, a banda foi surpreendida com uma visita de uma figura extremamente importante para a história do grupo: Syd Barrett. Fundador do grupo, Barrett foi guitarrista, vocalista e principal compositor do Pink Floyd durante seus primeiros anos de carreira. Responsável pelo primeiro álbum da banda, o psicodélico The Piper at the Gates of Dawn (1967), Barrett era considerado por muitos como um promissor gênio do rock n’ roll. Entretanto, devido a inúmeros problemas de saúde mental, agravados pelo uso excessivo de drogas e dificuldades de lidar com a fama, Barrett foi afastado da banda em 1968, perdendo o contato com os demais membros.
Anos depois, durante as gravações do que viria a ser o novo álbum da banda, que agora estava no topo do sucesso, Barrett apareceu de surpresa no estúdio. De início, não foi reconhecido pelos músicos, afinal, no lugar da figura esguia, de longos cabelos cacheados e com um olhar esperançoso e criativo de jovem artista, estava um homem obeso, sem pelos na cabeça ou no rosto, com um olhar pesado, mórbido, marcado por olheiras profundas e um semblante desesperançoso.
A visão de seu antigo companheiro, antes alegre, naquele estado tão triste deixou uma marca profunda nos membros da banda, e foi o que os norteou no processo criativo do novo álbum. Lançado em 12 de setembro de 1975, Wish You Were Here leva os ouvintes a uma viagem pela condição humana de solidão, isolamento e saudade, marcada principalmente pelo profundo sentimento de ausência. O álbum, que completou seus 50 anos em 2025, foi, e ainda é, um grande sucesso, não somente na discografia do Pink Floyd, mas também no mundo da música em geral, por muitos considerado como um dos melhores discos de todos os tempos.
A imersão se inicia logo pela capa do álbum: a clássica fotografia de dois executivos num aperto de mão enquanto um deles pega fogo, tirada pelo fotógrafo Aubrey “Po” Powell nos corredores dos estúdios da Warner Bros, diz muito a respeito da temática que guia o trabalho. Idealizada pelo estúdio Hipgnosis e pelos membros da banda a partir de uma análise das músicas presentes, a ideia era passar uma sensação de ausência de sentimentos: um gesto cotidiano, como um aperto de mãos, perde cada vez mais o significado, representando a ausência cada vez maior de sentimentos verdadeiros nas relações humanas. Além disso, a figura em chamas de um dos personagens representa aqueles que escondem suas emoções por medo de serem prejudicados (ou melhor, queimados), criando cada vez mais um movimento de autoisolamento social. Finalizando a identidade visual da obra, o disco era vendido completamente encapado por um plástico preto, concretizando uma comunicação metalinguística ao vender uma “ausência de capa”.
Partindo para as canções, a obra se inicia com a arrebatadora “Shine on You Crazy Diamond”. A faixa, verdadeiro hino do pop-rock progressivo, é dividida em 9 partes, sendo que as 5 primeiras abrem o álbum, e as últimas 4 fecham. A música como um todo funciona como um tributo a Syd Barrett, levando o ouvinte a uma viagem onírica à mente genial e perturbada do artista. Tanto nas seções instrumentais quanto nas partes líricas, são utilizadas metáforas e metalinguagens para representar tanto a angústia de Barrett ao tentar lidar com seus traumas quanto a dor da banda de perder seu fundador e grande amigo.
Logo em seguida, o clima simbólico, onírico e, em certa parte, melancólico, é brutalmente interrompido pela pesada e sufocante “Welcome to The Machine”, uma forte denúncia à indústria musical e à sociedade cada vez mais artificiais, com foco no impacto disso na mente de jovens promissores – clara alusão a Barrett e suas dificuldades. A voz rouca e quase chorosa de Roger Waters ao se revoltar com a mecanização das relações sociais e a perda gradual das identidades individuais, somada ao som futurista e sombrio, cria um ambiente claustrofóbico e cinza sem nenhuma aparente escapatória. Todos estamos condicionados a sermos dominados pela Máquina.
Ainda na linha das críticas sociais, o lado B do disco inicia com “Have a Cigar”, que continua os ataques à indústria musical, porém agora com um tom mais ácido. Cantada pelo músico britânico Roy Harper, a música representa como os executivos da indústria musical lucram em cima do trabalho dos artistas, fazendo promessas rasas e colocando os artistas em uma posição de produto. Ainda com sons futuristas e riffs de sintetizadores, mas, dessa vez, com um tom mais irônico do que sombrio, a faixa ressalta ainda mais a insatisfação da banda com o mercado musical. Além disso, ambas as faixas, essa e “Welcome to The Machine”, representam a indústria social como uma área vazia, sem significado ou qualquer tipo de emoção, conectando-se ao tema guia do álbum.
Agora, chegamos à música que melhor representa o clima do álbum. A faixa-título, “Wish You Were Here”, funciona como uma ode ao sentimento de ausência. A clássica introdução, tocada em um violão de 12 cordas, seguida pelos solos acústicos, é impossível de ser esquecida – assim como aqueles que vêm e vão em nossas vidas. A letra é uma poesia à parte: com metáforas e simbolismos fortes, a canção leva o ouvinte a uma profunda reflexão sobre a solidão humana, trazendo um lamento sincero sobre a falta de conexões duradouras e a respeito do sentimento de saudades de alguém que pode não voltar. Sendo direto: é simplesmente lindo.
Fechando o disco, temos as partes finais de “Shine on You Crazy Diamond”, que colocam a cereja no topo do bolo concluindo a obra com a homenagem a Syd. A pegada é a mesma que as primeiras partes: um tom simbólico e onírico para representar a perdição de uma mente genial, transformada em perturbada. Aqui, o que se destaca mesmo é a parte final: um solo de saxofone que finaliza a temática melancólica com um certo toque de esperança de que dias melhores virão. Ou talvez um lembrete de que, em certos momentos, a ausência, a saudade, o controle e tudo o mais são necessários para que prossigamos a vida. Afinal, não seríamos humanos sem a capacidade de sentir de tudo, inclusive coisas ruins.
Depois de toda essa viagem, não consigo descrever esse álbum com outras palavras além de “genial”. Por mais que eu admita que The Dark Side of The Moon é a melhor coisa que eu já ouvi na minha vida, Wish You Were Here tem um lugar especial como meu disco favorito da banda. Lembro até hoje da sensação de ouvir os primeiros toques de “Shine on You Crazy Diamond” e me sentir transportado para um universo paralelo. Mais do que um álbum musical, Wish You Were Here é uma reflexão sonora sobre tudo aquilo que sentimos sempre que perdemos alguém: raiva, insatisfação, saudade e, principalmente, o vazio que fica em nossos corações. Mesmo depois de meio século, a música do Pink Floyd continua atual, e é impossível classificar Wish You Were Here como menos do que uma verdadeira obra-prima.







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