A nossa Diretora Presidente Giuliana Paro escreve um breve texto sobre a perda das coisas, das pessoas e dos momentos enquanto o tempo passa. A vida às vezes parece eterna, mas a eternidade também tem coisas ruins.
Hoje o tempo voa. Bate asas tão aleatoriamente que muitas vezes nem avistamos o horizonte em seu perfeito declínio. Embora o conhecimento humano já tenha capacidade suficiente para declarar que nenhum ser vive infinitamente, a sociedade atual está transbordando minutos. Cada sorriso possui seus milésimos e segundos acumulados no interior para serem desperdiçados. É como se cada momento perdido fosse uma pressão impiedosa de nossos relógios para com nossas vidas que tão sutis celebramos.
Um minuto a menos, outro a menos, e outro, e outro, e outro...
O encantamento do homem pelo prazer do viver se torna superior àquela capacidade de compreender que a eternidade nunca será presenciada por alguém. Sabemos que ela existe neste mundo de hipocrisia e perdão, mas nunca teremos a habilidade - se é que isso é algo digno de talento - de enxergar o fim deste desejo jamais anulado, até porque a eternidade é eterna e assim será para sempre. Você entende a maestria da eternização?
São os infinitos que amedrontam as ambiguidades da vida. Esta é a polêmica indefinida do infinito do amor. Pois o mesmo é mais forte que o infinito dos números. O mesmo segue seu contínuo sentimento. O mesmo apenas acontece: amamos e somos amados, às vezes infinitamente. Sentimentalismo talvez seja isso: um infinito desconhecido sem um pingo de razão. A infinidade numérica, repleta de motivos, é um amontoado de algarismos que se seguem porque possuem uma ordem, uma padronização matemática, um eixo que se desencadeia do menor ao maior, do zero ao infinito que se queira chegar. De onde vem o infinito metafórico? Provavelmente da não compreensão, do desconhecimento, do rancor guardado ou da paixão engolida a seco. É através do sofrimento que a saudade nos habita e do amor que nos alucina.
Veia que deseja ou sangue que pulsa? Talvez seja ao contrário, mas para algumas pessoas a ordem não importa. Porque assim que funciona o sentimento em terra firme: nem os fins e nem os meios são indispensáveis quando a finitude nos atinge. Quando perdemos aqueles que deram e dariam de tudo para que a infinidade da relação fosse estabilizada e nunca mais danificada por ninguém, nem pelos deuses ditos lá em cima. Camões já dizia que o amor ardia como fogo e a cegueira nos era imposta para que o incêndio queimasse a pele, tão peculiar e tão insensível como uma ferida que dói e não se sente. E o quão destruidor é não ouvir a sinfonia da voz daqueles que partem para a constelação acima de nós? Não refletir os olhos na pupila que transparece a esperança e os motivos? É temer a felicidade que resulta da angústia de continuar a vida. E nós vamos rindo das meticulosidades temporárias da graça de viver. Mas haverá sempre o momento final de cada gargalhada e de cada escalada ao topo do mundo onde perceberemos que eternizar um sorriso é muito mais abrir mão da realidade do que abraçar a insanidade.
O tempo? Implacável. Afasta corpos, mas as almas não. Afasta aqueles com quem aprendemos a lutar e a retirar de qualquer dicionário próprio a palavra desistir. Dias passam a não ser mais dias, porque manhãs passam a ser uma única noite. É a lição que nem ele, o tempo, consegue concretizar no livro de aprendizados humanos. É o vazio irreparável que eterniza a concepção: a vida é uma questão de laços invisíveis e eternos em qualquer dimensão.
Contudo, acredito que o principal conceito seja a falha humana. O que poucos sabem e muitos ignoram é a capacidade incrível do ser humano de prometer falhar. Prometer errar constantemente e dedicar parte das 24 horas diárias à imperfeição. A humildade ultrapassa a capacidade de qualquer texto ou conjunto de palavras sem coerência, porque mostra aquele que sempre está disposto a aperfeiçoar. Saber que nada se sabe – frase essencial na contemporaneidade brasileira – é também um artifício para a evolução. O medo, por sua vez, não é admitir. É assumir muitos esquecimentos e jamais enterrá-los junto aos fracassos.
Tempo irreparável de coisas boas e coisas ruins. Isso também é eterno.
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