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JÁ SE ARREPENDEU DO VOTO?

Em face do contexto político caótico que tomou conta do país nesta última semana, nosso redator Pedro Gama apresenta uma reflexão sobre a trajetória catastrófica do governo Bolsonaro, e de como é necessário repensar nossos votos e nos voltarmos para um futuro livre de figuras políticas despreparadas e destrutivas.

Lembro-me de, nas eleições de 2018, ver um post no Facebook com uma imagem de urna eletrônica com as teclas 1, 7 e “confirma” sujas de sangue, assim como as mãos do eleitor que apareciam abaixo. Nesse post havia uma discussão em que muitos afirmavam que era alarmista e desonesto defender que quem votasse 17 ou nulo estaria matando pessoas. Não achei isso, e como eram eleições, entrei na discussão argumentando que a escalada da violência policial e do conflito agrário já seriam suficientes para um banho de sangue, sem contar as muito mais numerosas mortes indiretas que seriam levadas por uma gestão ignorante e anticientífica.


Com a eleição de Bolsonaro, pode-se dizer que o ideal vigilante punitivista foi muito valorizado, elevando-se assim a sensação de legitimidade da atuação policial violenta. Segundo dados do G1, o primeiro semestre de 2019 teve um aumento de 120 mortes por policiais, em relação ao mesmo período de 2018. Antes que se argumente que isso se justifica pela redução de mortes violentas no mesmo período, como faz o governador do Rio de Janeiro, diversos especialistas apontam que não há relação entre esses fatos.


A mesma legitimação ocorre na mentalidade de vários que acreditam que comunidades indígenas e extrativistas e reservas ambientais são entraves ao desenvolvimento nacional e um verdadeiro empecilho aos seus “empreendimentos” agrários. Creio que é em decorrência disso, que se intensificou o número de lideranças indígenas assassinadas em 2019. Foram 7 mortes ano passado, em comparação a 2 mortes em 2018, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Foi o maior número em pelo menos 11 anos. Em mesma perspectiva, o ano passado fechou com um aumento de 30% no números de queimadas na Amazônia.


A política institucional do governo consegue ser ainda mais assassina. A servir de exemplo, utilizarei a questão dos médicos cubanos que, por questões ideológicas, foram atacados pelo governo Bolsonaro, acarretando na retirada dos profissionais pelo governo cubano. Como consequência, 3 milhões de brasileiros chegaram a ficar sem atendimento de saúde pela falta de médicos e ocorreu um aumento de 12% de mortes de bebês indígenas em 2019. Essa ausência de assistência leva a uma quantidade de mortes difícil de ser calculada, e que provavelmente ultrapassa a das outras correlações citadas nesse texto.


Até então, ainda haveria quem argumentasse que as mortes causadas pela calamidade econômica do PT superariam em muito esses números. Frente ao novo coronavírus, creio, ou pelo menos espero, que ninguém de moral mínima ainda batesse nessa tecla. A verdade é que, como veremos nos próximos capítulos da quarentena, a ignorância negacionista elevada à Presidência da República, em seus atos movidos pela sacralização econômica, levará-nos à morte de vários milhares, ao ponto de ex-ministros da saúde denunciarem Bolsonaro junto à ONU por genocídio. E você que teclou 17 também é responsável por isso. Se parar para refletir um pouquinho, perceberá que agora suas mãos estão sujas de sangue.


Muitos me dizem por aí que “não é hora de apontar dedos” e que a saída “madura” para a queda efetiva do bolsonarismo é na base do diálogo e do convencimento. Naquela discussão de Facebook em 2018, também me disseram a mesma coisa. Na época concordei, já que não se convence ninguém a mudar de voto acusando-a de “assassina”, o que é pelo menos a forma como a minha indagação seria recebida pela pessoa. No entanto, não estamos mais em 2018, ano de plena polarização política e auge do bolsonarismo. Não é hora de sermos mansos e sabiamente persuasivos. No alto da crise política atual, chegou o momento da repressão, tanto institucional quanto moral.


Estou na torcida para que o inquérito policial das fake news contra Carlos Bolsonaro seja minucioso e incriminante, e para que acabe a suspensão das investigações que usam dados do Coaf para dar andamento ao processo de Queiroz e Eduardo. Torço para que o STF abra o inquérito contra Jair Bolsonaro para apurar crimes de interferência na Polícia Federal e para que Sérgio Moro esteja munido de evidências contra a Presidência da República nesse sentido. Torço para que o Congresso Nacional protocole a abertura de impeachment e pipoque de CPIs. Torço para que o presidente renuncie. Torço para que todos torçam por isso também. Tudo isso seria uma linda demonstração de que, acima de qualquer ideologia, estão as instituições democráticas, e de que quem tentar desmontá-las é quem será desmontado, pedaço por pedaço, dentro das regras do jogo. Como seria lindo ver o clã Bolsonaro ser varrido do auge público diretamente para aquele condomínio covil de milicianos ou, se possível, para um presídio, lugar a que provavelmente pertence.


No campo moral, chegou a hora de apontar o dedo, mostrar às pessoas que votaram 17 ou nulo (voto que favorece quem está na frente) o desastre que elas provocaram, a imbecilidade que cometeram e as muitas mortes que causaram. Vamos lembrar do quanto devem ter se doido com a saída de Sérgio Moro, quando clamavam que salvariam o país da corrupção, simplesmente porque caíram no mais barato discurso populista e demagogo. Uma coisa linda de se ver. Tem que deixar a ferida aberta para que para sempre olhem para esse momento de suas vidas, as eleições gerais de 2018, com vergonha e arrependimento, e para que isso tenha para sempre seu lugar memória coletiva do povo brasileiro, já que a ditadura militar aparentemente não teve.


E para você da FGV, que fez essa estúpida escolha de catástrofes premeditadas, peço que tome consciência disso. Olhe pra cagada que você fez. Não falo isso por capricho orgulhoso de quem quer ter sempre razão, gosto de ter razão, mas nesse caso, preferiria que não a tivesse. É só olhar ao seu redor e ler a porra de um jornal quando as pessoas estiverem morrendo aos montes na fila da UTI. Se você, genuinamente, não se arrepender e sentir vergonha do seu voto, tenho dúvidas de que tipo de pessoa você é. Diria que simplesmente caga e anda pra tudo o que não acontece no seu mundinho.


Mas você que, genuinamente, se arrependeu, meus parabéns. Não é fácil admitir quando fazemos uma cagada dessas, e muitos menos se redimir dela, embora isso não mude o que tenha feito. Mas agora já pode ensaboar as mãos generosamente e ajudar a matar a porra desse vírus que tomou conta da república brasileira, que, quando você perceber, estará com as mãos limpas. Vamos torcer para esse parasita cair e que tudo isso fique como uma lição inesquecível de que ele nunca mais.


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