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O CICLO DAS ANDORINHAS

Toda primavera, o céu se enche de pequenas silhuetas.

Com seus corpos curvos, como vírgulas em movimento, elas cumprem a mesma função — por um instante apenas, pausam meu olhar.

Fiéis a um tempo que não é nosso; alheias à pressa, problemas, preocupações...

A cidade muda, as pessoas mudam, o que antes era certeza, hoje se desfaz.

Ainda assim, as andorinhas voltam todo setembro.


O tempo delas não pergunta, só repete. 

Afinal, as andorinhas não fazem vinte anos — talvez por isso não se percam.

Eu, por outro lado, nunca tive promessa do próximo setembro.

Passo de outubro a agosto tentando entender.


Penso no que desejo, no que acredito, no que me prende.

Penso em amigos que cresceram, em lugares que deixei, no que já fez sentido.

Penso em tudo que já tive e hoje não tenho mais.


Mas então vejo as andorinhas.

Elas me lembram, em silêncio, que ainda há tempo por vir.

Que um dia as verei de novo e, neste reencontro, me lembraram de mim.

Mesmo que um outro eu — aquele que ainda não fui, mas que já me esperava.


Não importa o que aconteça, algo há de riscar o céu da minha varanda.

De me fazer olhar para cima, uma outra vez. 

As andorinhas voltam todo setembro.





Autoria: Nina Neves

Revisão: André Rhinow, Isabelle Moreira

Imagem de capa: Pinterest

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