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O MITO DO SEBASTIANISMO E MESSIANISMO NO BRASIL


Nosso redator Gabriel Freitas explora os desdobramentos do mito do sebastianismo e sua relação com a cultura política brasileira: será que não depositamos esperanças demais numa figura única, esperando que um salvador virá resolver todos nossos problemas?




A partir das trovas de Gonçalo Annes Bandarra foi difundido pela península ibérica o famoso Mito do Sebastianismo ou, como é popularmente conhecido em Portugal, o “Mito do Encoberto”. Tal narrativa tem, na contemporaneidade, três explicações plenamente aceitas: a figura de “o Encoberto”, constante nas Trovas de Bandarra, a figura de D. Sebastião e a interpretação efetuada por Fernando Pessoa. No entanto, para fins deste texto, acredito que basta a análise da explicação mais tradicional, a de D. Sebastião.


A explicação mais convencional centra seus esforços na narrativa de um rei que se autodeclarava “o último cruzado”. Influenciado pelo papa e por Filipe II, o jovem dom Sebastião montou uma armada de 18.000 homens para combater os mouros que habitavam o norte da África. Entretanto, ao atravessar o estreito de Gibraltar, ele e sua armada foram brutalmente derrotados, de forma que o jovem rei desapareceu em Alcácer Quibir.


O desaparecimento do jovem rei causou um enorme transtorno no reino português, pelo fato de que D. Sebastião não havia deixado herdeiros e era o último membro da dinastia dos Avis. Dessa forma, de maneira sintética, o trono português caiu em mãos espanholas, já que Filipe II, rei da Espanha, era o parente homem mais próximo do desaparecido monarca.

Diante de um cenário de dominação fortemente repudiado pelos portugueses até hoje, surge o mito do Sebastianismo. Tal mito tem como essência a crença messiânica de que um rei português (à época, acreditavam na própria figura de D. Sebastião) apareceria para salvar sua nação do governo espanhol. É um mito cujo aspecto central é a esperança em de que existe uma pessoa que salvará a pátria resolvendo todos os seus problemas, o que de certa maneira ressalta a existência de um nacionalismo futuro.

Este mito foi tão amplamente difundido que apareceu em algumas falas do Padre António Vieira e na obra de Eça de Queirós “A Cidade e as Serras” (a figura do Jacinto de Tormes). De certa maneira, também se relaciona com a figura de Antônio Conselheiro em Canudos e com a crença em um governante capaz de transformar o país sozinho.


A noção por trás do Mito do Sebastianismo explica muito a respeito de algumas posturas adotadas por nós brasileiros. A crença em um Executivo plenamente soberano e o “complexo de vira-lata” são posturas que apenas reforçam essa herança.

Há, em certa medida, uma delegação por parte de nós brasileiros da responsabilidade por alguns atos praticados por nós ao próprio país. Dessa forma, existe uma espiral em que o Executivo é visto, de maneira geral, como um poder absoluto, capaz de resolver todos os problemas. E isso é justamente uma concepção pautada em um nacionalismo futuro, isto é, na esperança de que virá uma pessoa capaz de salvar a nação da desgraça e carregá-la, sozinha, para o melhor caminho.

Com isso, pode-se entender que na atual sociedade brasileira a noção de um nacionalismo futuro encontra-se presente, sendo um elemento determinante na postura do brasileiro. Em razão dessa crença em um Messias, discursos que tocam nessa questão ganham grande força entre a população, sendo extremamente populares. Sendo assim, nota-se uma forte presença do Mito do Sebastianismo na sociedade brasileira contemporânea, de forma que a evidência fática é a alta popularidade de discursos centrados em uma figura messiânica, a qual se diz capaz de, sozinha, colocar o país no rumo certo.


Textos para se aprofundar na questão de D. Sebastião:

BOURDON, Albert Alain. História de Portugal. 3. ed. Lisboa: Texto&grafia, 2015, Capítulo 3.


Trilha Sonora sugerida:

“O Grilo”— Herói do Futuro

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