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O MUNDO É APLICATIVO DE RELACIONAMENTO



E pensou um pensamentozinho:


Não devemos lamentar pela tua mania de ver luz em tudo que é canto, mas pela pouca que muitos outros têm.



Ser, o ser, engolido


Baixei um aplicativo de relacionamento

Às vezes penso que ele quem me baixou

E fomos nos conversando:

Ele me baixando, eu baixando

- Vezes e cada vezes mais

Baixando-baixando-baix...


Foram vezes tantas que virou multiplicação

Fui parar do outro lado

- Descobri as costas do meu coração

Não foi tarefa difícil, parecia haver muito espaço

Calado ou gelado, não fui muito sábio


Então engoli uma aceitação e puxei-colando:

Descrevi-me recheadamente com pseudogostos

Contei ambições um pouco preguiçosas

Fui falando verdades conforme pessoas e momentos que...

Pareciam,

Apareciam,

Desapareciam,

Desapercebiam,

Desconcebiam,

Transtornarcabar-se-iam

Cada vez maior, vai faltando verbo

Ah, aquela ausência de cadência…

O olhar não se demora


Moro num aplicativo de relacionamento

Casa sem parede, chão sem teto

Hoje em dia me causa mais medo,

É tanto segredo!

Tão pouco sentimento!

Que me esqueço:

Vou chovendo por dentro



Conhecendo uma luzinha escura


Fito o horizonte desfocadamente em perdição

Encontro possibilidades

São parte de nós? De mim?

Tudo se esfacela num desenfrear


Sou obrigado deixar de canto,

Tentar ver outros sentidos,

Firmar os pés no chão:

Esquecer-te, esquecer-nos, esquecer-me

Esqueço minhas projeções mais longínquas

- uma miragem que parecia transbordar boas coisas


Mas o fim acontece,

parece que esquecer é reviver

Esquecimento vai calando do jeito dele

- Meio grosso, meio suprimindo relações

Então conheço outro alguém - novo, de-novo, re-novo

A toda bagagem passada surpreende, tudo reinicia

“Que brilho mais curioso!”, indago


Rondo nessas posições

As coisas apenas acontecem

Não sei quão aposemáticas essas pessoas são

Todo mundo passa a ter gosto mesmo


Mas mesmo assim insisto:

Se ver-se:

Meu “sim” é teu “não”,

E vice-versa (ou versa-vice)


Correr na avisação feliz

Nunca avisar

Sempre sendo avisado

“Um dia a gente se encontra”

O desejo se reinventa



Há busca, a busca


Procuro peculiaridades,

Encontro padrões

Nesse amar-todo-mundo,

Amo padrões,

Esqueço do meu:

Desilusões entre ilusões

Um eterno recuperar-se

Nada mais sádico que as paixões



Gostando ou não, gostando de outro Mundo


O mundo não gosta

Não gosta de gordos

Não gosta de feios

Não gosta de acelulares

Não gosta de laços

Não gosta de emocionados

Não gosta de atirados

Não gosta de enxeridos

Não gosta de encaracolados

Não gosta, o mundo não gosta

Gosta camaleão

Não, não gosta de nada

Não gosta, o mundo não gosta não

Não gosta nem de foto mal fotada

Do que o mundo gosta?

Talvez ele goste de muita coisa

Mas ninguém gosta do que ele gosta

Ele gosta de sombras

Das rispidezes também gosta

Está na hora de eu dizer de que gosto, Mundo

Mundo, não, não tenho gostado de você

A luta se perde sendo Mundo

Mundo, chegou a sua hora

Você não é vasto, Mundo

Meu coração já também não



Aquele que nasceu com o um dedo a mais


Aquele que nasceu com,

Fez muitos pagarem mais,

Fez a si mesmo pagar muito mais,

Fez todo mundo pagar ainda muito mais.

Mas estamos a descobrindo o quê.



Às ondas, vida longa; a vida é longa!


Desdesdeixe as ondas do teu cabelo crescer

Todo universo é verso em palavras de Oceano

Desdesdeixe de lado as preocupações com divagações alheias

Vá! – Fluindo; indo; sendo; escorrendo...

Desdesdeixe as ondas do teu cabelo fluir

Tem gosto pra tudo, tudo é muito gostoso

Desdesdeixe essa mania de olhares pra trás



Gabriel Linares, 2021


Autoria: Gabriel Linares

Revisão: André Rhinow & João Vitor Garcia Vedrano

Imagem de capa: "O grito" (1893), Edvard Munch


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