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O NOVO ROTEIRO DA MODA: COMO "O DIABO VESTE PRADA 2" DISCUTE A FRAGMENTAÇÃO DAS TENDÊNCIAS NA ERA DIGITAL

Can you please spell “tendência”? “O Diabo Veste Prada 2” me parecia uma sequência extremamente difícil de imaginar, justamente pelo que ela poderia querer abordar na sua nova história. O longa-metragem icônico dos anos 2000 vai ganhar uma continuação que deve estrear em maio do próximo ano. E o mais curioso é que, apesar de o primeiro filme ter sido baseado em uma série de livros, ninguém realmente esperava por uma continuação depois de tanto tempo — ainda mais com Meryl Streep voltando, já que ela é conhecida por evitar continuações. Mas, pelo que parece, ela se interessou pelo projeto e resolveu aceitar — o que já nos dá um sinal de que alguém no time está pensando em algo sério.


Segundo algumas notícias, a proposta do novo filme é acompanhar Miranda nas configurações atuais, enfrentando as mudanças no mundo da comunicação: o declínio do jornal impresso e, provavelmente, uma forte ascensão das redes sociais. Esse é um tema bastante pertinente de explorar, e o universo de "O Diabo Veste Prada" tem potencial para fazer uma análise afiada dessas transformações sociais e culturais. Afinal, o que a moda e o poder representam em um cenário de rápidas mudanças, onde tendências nas redes sociais surgem e desaparecem em questão de horas? Essa reflexão se conecta não só com a narrativa do filme, mas também com a própria essência da moda contemporânea.


Na era digital, a moda deixou de ser um universo centrado em referências duradouras e se tornou um mosaico de tendências fragmentadas, moldadas pelo ambiente das redes sociais. Plataformas como Instagram e TikTok aceleraram a circulação de tendências, criando uma efemeridade sem precedentes. Algo que viraliza hoje pode ser esquecido amanhã — uma hashtag, um vídeo ou um influenciador que dita o estilo do momento. Essa velocidade faz com que as tendências sejam cada vez mais passageiras, muitas vezes desconectadas de uma narrativa coerente ou de uma história maior. Assim, a moda se fragmenta em múltiplas microtendências, convivendo de forma dispersa e muitas vezes concorrente, desafiante às antigas referências de uma estética clássica ou atemporal.


Esse movimento acelerado e disperso impacta profundamente o universo da moda e da cultura pop de forma geral. Filmes como "O Diabo Veste Prada 2" podem espelhar essa nova realidade, mostrando personagens e figurinos que refletem essa diversidade de estilos passageiros. O cenário de Nova York, uma das maiores capitais mundiais da moda, reforça ainda mais essa conexão. A cidade é um símbolo de inovação, influência e velocidade — um palco perfeito para ilustrar como as mídias, as plataformas digitais e as tendências instantâneas moldam o modo de consumir e criar moda. As ruas movimentadas, as vitrines iluminadas e os figurinos ousados do filme capturam essa essência de uma moda que é ao mesmo tempo glamourosa, caótica e efêmera.


O figurino, que sempre desempenhou papel fundamental na construção da narrativa de "O Diabo Veste Prada", reforça ainda mais essa ligação. Patricia Field, responsável pelo visual marcante do primeiro filme – e figurinista de outras obras marcantes como "Sex and the City” – , conseguiu criar um estilo que refletia a sofisticação da moda nova-iorquina, ao mesmo tempo em que celebrava sua rapidez e sua diversidade. Cada peça se tornava uma declaração de identidade, poder e atualidade, absorvendo as influências do cenário urbano em constante transformação. A ambientação não foi à toa: essa cidade, conhecida por ser um epicentro de tendências globais, serve de cenário para mostrar como o universo fashion é influenciado por uma dinâmica de inovação contínua e veloz.


Com o cenário urbano em jogo, sustenta-se a narrativa de que, na atualidade, a moda é movida por influências rápidas, que emergem instantaneamente das plataformas digitais. Em um ambiente onde uma tendência pode ser criada por uma influencer em questão de horas e desaparecer pouco tempo depois, a moda passou a se transformar em um fluxo ainda mais rápido e constante de novidades. Assim, o filme pode explorar essa dicotomia: a permanência e o poder de uma figura como Miranda, frente a uma cultura de tendências voláteis e virais.

Ao mesmo tempo, a estética visual do filme reflete essa nova dinâmica: figurinos altamente contemporâneos que fazem referência às tendências rápidas, sem perder a essência da sofisticação do universo de alta moda. O novo longa promete se estabelecer em um formato quase metalinguístico, onde denuncia essa efemeridade do jogo fashion atual enquanto se utiliza de ferramentas da cultura pop tanto de divulgação quanto de identidade visual e construção de imagem.


Assim, a narrativa conta sobre a era digital, o papel das mídias e das plataformas online que não apenas influenciam, mas redefinem muito as regras do jogo fashion. Nesse cenário, a figura de Miranda Priestly representa a moda como uma construção, revisitando conceitos mais tradicionais do ramo, enquanto lida com a transformação em rotina de adaptações contínuas, onde autenticidade, versatilidade e atualização constante são essenciais.

Espera-se, portanto, que o filme não desperdice a chance valiosa de discutir – pelo menos superficialmente – a constante efemeridade que assola o universo fashion. Impulsionadas pelas plataformas digitais, a infinidade de "trends” e “cores” têm um impacto profundo no universo da moda e na cultura contemporânea. Esse ritmo acelerado provoca e denuncia uma certa fadiga digital na geração atual, que se vê cada vez mais sobrecarregada por uma enxurrada de novidades que, muitas vezes, perdem seu valor em questão de horas ou dias.


Como consequência, a moda enfrenta uma perda de significado duradouro, reduzindo a possibilidade de criar identidades sólidas e autenticamente expressivas. Além disso, essa lógica de tendências passageiras reforça uma cultura de consumo superficial, onde a busca por novidades se sobrepõe à valorização de escolhas conscientes.


Por isso, o filme tem potencial para mostrar que, apesar dessa fragmentação de tendências, o universo fashion continua sendo uma arena de poder, criatividade e expressão cultural. Para além, revisitar essa velocidade insustentável, refletindo sobre a importância de desacelerar, promover a autenticidade e valorizar a moda como uma expressão cultural que vai além da efemeridade se torna um ponto de reflexão que ganha ainda mais relevância no contexto de uma sociedade saturada de informações e sobrecarregada pela fadiga digital. Mesmo em meio à efemeridade, há uma busca por identidade e significado mais profundos, que o cinema consegue capturar ao retratar essa relação de influência e transformação.


Em suma, "O Diabo Veste Prada 2" promete explorar não apenas o universo dos figurinos ou a ambientação em Nova York, mas também uma reflexão profunda sobre como as mídias, as plataformas digitais e as tendências em rápida mudança moldam o modo de entender a moda na atualidade. Uma moda cada vez mais plural, dispersa, instantânea, mas também mais dinâmica e conectada às questões sociais, culturais e tecnológicas do nosso tempo.


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