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OS DONOS DO FUTURO

Linha fina: Temos o direito igual a dizer quando, como e para onde nosso futuro aponta e, se ninguém nos der o espaço para tal, o criaremos nós mesmos.


Em sala de aula, não é ensinada a força coletiva que o estudante tem em mãos. É possível ir longe: a sociedade não sabe o poder que possui quando organizada, tanto para ajudar quanto para ser ajudada, principalmente quando se diz respeito aos jovens. As hierarquias de poder e acessibilidade são feitas de tal forma que há de esperar até no mínimo os 18 anos para começar a ter agência sobre a própria vida, como se muitas das coisas que ocorrem depois dessa idade não fossem frutos do que veio antes dela — aulas musicais, o aprendizado de outros idiomas, capacidade física e financeira de locomoção, chances de pagar um bom cursinho pré-vestibular e por aí vai.


Tendo em vista esse molde que não escolhemos, mas aceitamos, a combinação da educação acompanhada da organização coletiva pode abrir portas metafóricas e literais para uma pessoa. Não é à toa que os anos formativos coincidem com os anos escolares: as primeiras interações hierárquicas acontecem em sala de aula, as primeiras experiências, primeiras amizades e possivelmente a primeira vez em que ocorre a auto-reflexão. Do jardim de infância até o ensino médio, professores, colegas de classe, cadernos e lousas são constantes no pano de fundo de um indivíduo enquanto ele cresce dentro de si. A repetição faz a frase perder um pouco do impacto, mas, de fato, a educação é libertadora. Ela tem que ser libertadora.


Na parte prática e utilitarista, a educação é a mais efetiva ferramenta de ascensão em um país de alta desigualdade social. Estudos mostram que, no Brasil, ter um diploma de ensino superior aumenta a remuneração de uma pessoa em até três vezes. Para aqueles cuja carreira escolar nunca foi ameaçada pode parecer uma banalidade, porém, segundo levantamento feito em 2019, 52% dos brasileiros entre 25 e 62 anos não têm sequer um diploma do Ensino Médio. E essa estatística é majoritariamente composta pela mesma demografia de pessoas periféricas. Muitas vezes, ficam limitados a reagir às condições — deixam a escola, porque a família precisa de renda extra, não tiveram aula durante a pandemia, pois não tinham acesso à Internet, não entraram em determinada faculdade por falta de bolsa ou auxílio etc.


Socializadas em um meio em que o ensino acadêmico é um luxo ou uma bobagem, perdem a chance de realmente pularem de classe socioeconômica por falta de conscientização e amparo.

É justamente por conta desses percalços e do poder libertador da educação que os coletivos que nascem nesse meio são tão importantes. Muitas vezes, a porta de entrada para a compreensão de sua posição social, tanto a produzida pelo o que lhe foi dado quanto a que está em suas mãos para criar centros acadêmicos, movimentos identitários e projetos sociais impulsionam essa reflexão no indivíduo. Visto na posição de poder — e dever — de agir em prol de si e de seu grupo, essas pessoas saltam da posição de expectadores para agentes. O ensino superior é o momento e local perfeito para isso. É de extrema necessidade que os alunos se unam para provar a si mesmos que, apesar do sistema educacional falho, governo omisso e falta de recursos para que se dediquem à educação, tem gente querendo — e muito — que eles sigam seus sonhos e se tornem quem eles querem ser.


É de gratificação e realização pessoal gigante fazer parte de uma união estudantil. É empoderador saber que suas preocupações também ressoam na mente de outros, pares de braços que se somam prontos para fazer acontecer. Daniel Souza, hoje aluno de Direito no Mackenzie, sequer tinha ideia de tudo que aconteceria há dois anos, no início da pandemia, quando não tinha um computador para estudar para o vestibular. Foi quando entrou em contato com a ONG Papo Futuro, completamente operada por estudantes, que o jogo virou. “Fui um dos primeiros alunos ajudado pelo projeto, de uma família de 14 filhos e com uma situação extremamente desfavorável. Hoje em dia, estou cursando faculdade com bolsa de 100% e sou estagiário no maior escritório de Direito da América Latina, o Mattos Filho. Eu posso dizer que são conquistas minhas, mas prefiro dizer que são conquistas em conjunto, vitórias coletivas.”. Mais tarde ele se juntou ao projeto pelo impulso de querer ver o que lhe aconteceu se espalhar.


As uniões estudantis têm um caráter muito próprio de nutrir a alma de todos que as tocam enquanto ocupam seu espaço e tecem o futuro e o presente com as próprias mãos. O mesmo pode ser dito sobre a educação. Em cada jovem que se envolve está a chance de um futuro brilhante e de gerações ainda mais prósperas que a dele. Dentro de cada um, há a noção de que, para nós, ninguém melhor que nós mesmos. E por mais assustador que pareça, isso carrega um poder igualmente gigante: apesar de tudo e todos, temos a nós mesmos.


Autoria: Maria Eduarda dos Anjos

Revisão: André Rhinow e João Vitor Vedrano

Imagem de capa: Google Imagens



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