Sinto que tudo o que faço é em nome de uma tentativa falha de me encontrar. Cada uma das vezes que pintei o cabelo de alguma cor maluca, todos os livros que li, todas as viagens que fiz e lugares duvidosos que frequentei, no fundo tudo tinha o mesmo propósito. Achava tudo muito divertido porque era inovador, mas depois de um tempo comecei a ficar de saco cheio. Não me encontrava nunca! Passei a largar os livros na metade, parei de pintar o cabelo e até as viagens começaram a ficar cansativas… Sentia que não estava em lugar nenhum pra ser encontrada, então do que adiantava a busca?
Comecei então a acreditar que me encontraria quando não estivesse me procurando, assim como diz aquela regra universal citada pelo destino acerca do misterioso paradeiro de um par de meias esquecidas em algum lugar aleatório. Passei a pensar que se virasse na esquina correta e na hora exata, acabaria me encontrando por aí com um chapéu e um livro na mão, me chamaria pra tomar um café e descobriria todas as respostas que andava procurando. Simples assim.
Por um tempo, tal cena me deu um certo conforto… Significava então que só precisava esperar a hora certa, e encontrar a esquina certa, que as respostas viriam. Mas até pra mim, que tenho uma imaginação fértil com um pé no devaneio, tudo começou a ficar ridículo demais. Tipo, eu nem uso chapéu, sabe?
Clarice uma vez disse que é preciso coragem para permanecer perdido. E a cada dia que passa percebo como ela estava certa. Não me entendam mal, para se encontrar é preciso determinação, é preciso um trabalho braçal quase que artístico para esculpirmos uma versão perfeita de nós mesmos até considerarmos tudo finalizado e darmos a obra como concluída. Mas não é preciso muita coragem. Quero dizer, o estúdio é confortável e já estamos familiarizados com as ferramentas mesmo… Já para continuarmos perdidos é preciso jogar fora as ferramentas e nos afastar de nós mesmos, sair do estúdio e andar por aí sem rumo. É preciso atravessar cada rua sem saber o que está do outro lado, ou até mesmo se existe um outro lado. É preciso começar e encerrar ciclos, ou quem sabe deixá-los meio abertos. E para isso, é necessário coragem. Muita.
Mas, da mesma forma que se encontrar é chato, ficar perdido cansa. A solução que achei foi então tentar me encontrar durante umas três horas por dia. Assim não me sobrecarrego demais tentando me encontrar e ainda sobra tempo para continuar perdida nas horas vagas. O único problema é quando me encontro sem querer… Daí desregula todo o esquema…
Autoria: Victorya Pimentel
Revisão: Luiza Parisi e Sofia Nishioka
Imagem de Capa: Pinterest (@Depositphotos)
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