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Superman: o herói que salvou uma nação

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Música para leitura: Punkrocker, de Teddybears feat. Iggy Pop ou Starman, de David Bowie



Desde sua criação em 1938, o Superman sempre foi símbolo de coisas boas. O jovem Kal-El foi enviado à Terra por seus pais biológicos diante da destruição iminente de seu planeta natal, Krypton, e foi adotado por uma família simples do interior do Kansas, EUA. Lá, Kal-El – ou melhor, Clark Kent – foi criado como uma criança normal (isso, claro, se ignorarmos a super-força, super-velocidade, visão de raio-x e todas as outras habilidades dos nativos kryptonianos), e lá viveu até se revelar ao mundo como o Super-Homem, herói poderoso que protege a humanidade de qualquer mal. Nos anos iniciais das publicações das HQs do Superman, o mundo vivia uma situação complexa. As crises econômicas recém sentidas pelos EUA, seguidas pelo terror do Terceiro Reich, criaram um caminho fácil para sentimentos de pessimismo, dor e, em muitos casos, desistência. Entretanto, ainda havia uma luz no fim do túnel. Nas páginas da Action Comics, os leitores eram recebidos por uma figura que exaltava poder, bondade e, sobretudo, esperança.

O Superman serviu como luz para aqueles que pensavam em desistir, para aqueles que já não viam mais possibilidade de vitória. O Superman salvou a humanidade, dentro e fora das páginas.

Nos anos seguintes, durante a Guerra Fria, o personagem ganhou outro significado. A esperança que antes era direcionada a qualquer um que estivesse sofrendo, em qualquer lugar do mundo, agora era direcionada ao povo americano. O herói ganhou força como símbolo da força nacional estadunidense na luta contra o avanço socialista da União Soviética, transformando o símbolo da esperança em arma política. Já nos anos 1970, o herói passaria por mais uma mudança: o filme Superman, de Richard Donner, lançado em 1978, trazia o ator Christopher Reeve em roupas coloridas e cara de bonzinho lutando contra o bilionário Lex Luthor ao som do clássico tema composto por John Williams. O longa trouxe de volta o espírito de esperança característico do herói, tirando-o das páginas de quadrinhos e mostrando tudo na tela do cinema. Maior, mais rápido, mais real. A partir de então, o Superman ganhou mais um espaço para se desenvolver. Além das HQs, surgiram jogos, séries, animações e mais filmes protagonizados pelo personagem, sempre com a aura bondosa e esperançosa. Até que ninguém aguentava mais. Nos últimos tempos, com o mundo cada vez mais introspectivo, individualista, cínico e pessimista, o Superman ganhou uma nova versão aos olhares do público. O super-herói esperançoso e magnífico deu lugar ao bobão que paga de bonzinho e usa cueca por cima da calça. De símbolo da esperança em tempos de crise a arquétipo obsoleto, o Superman sofreu uma decadência significativa. Não dava para seguir com esse “mais do mesmo”. Era hora de se reinventar.

Em 2013, surgiu a série de HQs Injustice: Gods Among Us, que trazia uma versão mais sinistra do herói. Após ser manipulado pelo Coringa para matar sua esposa Lois Lane, o Superman se torna um líder autoritário que deseja manter uma suposta “paz mundial”, utilizando-se de seus superpoderes para reprimir aqueles que vão contra seus ideais – irônico, não?

Somado a isso, vendo o império que a Marvel construía nos cinemas, a Warner Bros., responsável pelos direitos cinematográficos das histórias da DC Comics, não quis ficar para trás. Com isso, convidou o diretor Zack Snyder para comandar seu novo universo cinematográfico, o DCEU, e o escolhido para abrir esse novo capítulo foi, claro, o Superman. O filme Homem de Aço, de 2013, tentou recriar o estilo mais sóbrio, cru e, em certa medida, real dos filmes do Batman dirigidos por Christopher Nolan, sucessos absolutos no final da década de 2000 responsáveis por reviver o cinema de super-heróis. O longa, então, trazia Henry Cavill como um Superman sério e sombrio. Cara fechada, inimigo público, sem cueca. Essa visão cínica e cinzenta foi o que pautou não só o personagem, mas os demais filmes do DCEU por ele protagonizados, o (péssimo) Batman vs Superman (2016) e o (pior ainda) Liga da Justiça (2017).

Não é segredo que a empreitada da Warner Bros. no cinema de super-heróis foi um fracasso. Roteiros simples, plot twists fracos, e às vezes até engraçados (impossível levar a sério os dois maiores rivais parando de se odiar porque a mãe dos dois tem o mesmo nome) conduziram os filmes diretamente à ruína. Entretanto, há mais um fator que influencia essa decadência: o principal personagem desse universo não era aquele que conhecemos há tanto tempo. Por mais que o Superman roteirizado por Zack Snyder tenha seus fãs aqui e ali, fato é que ele não é o herói com o qual nos acostumamos. Não é o símbolo de esperança que jogou luz em tempos sombrios, o homem bondoso e gentil que se preocupa mais com a segurança das pessoas do que com derrotar seus inimigos. O “Superman do mal” deu certo em Injustice, funcionou em Homem de Aço, mas foi repetido tantas vezes (as continuações do DCEU, o Capitão Pátria em The Boys, Omni-man em Invencível) que se tornou obsoleto. O público que se cansou do Superman bondoso e gentil se cansou, ainda mais rapidamente, do Superman cruel e autoritário.

Entretanto, como o próprio Superman nos mostrou por tanto tempo, ainda há esperança: mesmo com o fracasso do DCEU, a Warner Bros. não desistiu de tentar competir com a rival Disney (detentora dos filmes da Marvel) nos cinemas. Assim, chamou como principal mente criativa de sua nova fase cinematográfica o diretor James Gunn, responsável pela trilogia de sucesso Guardiões da Galáxia na concorrência. Assim que chegou, Gunn já colocou os dois pés na porta lançando um excelente filme do Esquadrão Suicida, completamente diferente do fracasso de 2016 e dos filmes anteriores: mais colorido, leve e divertido. Tudo aquilo que uma equipe como essa – que, assim como os Guardiões da Galáxia na Marvel, se ajuntou não em busca de um bem maior, mas sim por circunstâncias externas às vontades de seus integrantes, e que nunca se levou a sério como um time de “super-heróis” – precisa. Com o sucesso do longa, Gunn se estabeleceu como salvador da DC nos cinemas, e começou a trabalhar em seu mais novo universo compartilhado. Oficializou algumas séries em streaming, até que chegou a hora de entrar na sétima arte, e não havia escolha melhor para isso do que o Superman. Mas, dessa vez, do jeito certo.

Lançado em 2025, o Superman de James Gunn tem tudo o que faltava no de Snyder, e ainda mais: esperança, bondade, gentileza, o supercão Krypto e — finalmente de volta! Depois de tanto tempo! — a cueca.

Nesse filme, o personagem retorna às suas origens e se transforma novamente em um símbolo de paz e esperança que transcende as telas: desde o lançamento do longa, comentários nas redes sociais de pessoas evidenciando como foram influenciadas pelo filme a praticar atos de empatia, ajuda ao próximo e gentileza só crescem cada dia mais, mostrando que sim, o Superman está certo ao dizer que, num mundo cinzento e pessimista como o nosso, “ser gentil é o verdadeiro punk rock”.

Por mais que seja sim criticado por algumas pessoas, é inegável que o Superman de James Gunn inaugura uma nova era no cinema de super-heróis: uma era vibrante, colorida, que traz de volta a sensação de calma e esperança diante de um mundo em colapso. Aquele herói que trazia brilhos nos olhos das crianças diante das ameaças do século XX volta para acalmar os corações do século XXI. E, dessa vez, veio para ficar.


Autoria: Pedro Anelli Bastos

Revisão: Ana Clara Jabur, Ana Carolina Clauss

Créditos da capa: Reddit


 
 
 

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